O menino que escrevia versos
Mia Couto
De que vale ter voz
se só quando não falo é que me entendem?
De que vale acordar
se o que vivo é menos do que o que sonhei?
(VERSOS DO MENINO QUE FAZIA VERSOS)
— Ele escreve versos!
Apontou o filho, como se entregasse criminoso na esquadra. O médico levantou os olhos, por cima das lentes, com o esforço de alpinista em topo de montanha.
— Há antecedentes na família?
— Desculpe doutor?
O médico destrocou-se em tintins. Dona Serafina respondeu que não. O pai da criança, mecânico de nascença e preguiçoso por destino, nunca espreitara uma página. Lia motores, interpretava chaparias. Tratava bem, nunca lhe batera, mas a doçura mais requintada que conseguira tinha sido em noite de núpcias:
— Serafina, você hoje cheira a óleo Castrol.
Ela hoje até se comove com a comparação: perfume de igual qualidade qual outra mulher ousa sequer sonhar? Pobres que fossem esses dias, para ela, tinham sido lua-de-mel. Para ele, não fora senão período de rodagem. O filho fora confeccionado nesses namoros de unha suja, restos de combustível manchando o lençol. E oleosas confissões de amor.
Tudo corria sem mais, a oficina mal dava para o pão e para a escola do miúdo. Mas eis que começaram a aparecer, pelos recantos da casa, papéis rabiscados com versos. O filho confessou, sem pestanejo, a autoria do feito.
— São meus versos, sim.
O pai logo sentenciara: havia que tirar o miúdo da escola. Aquilo era coisa de estudos a mais, perigosos contágios, más companhias. Pois o rapaz, em vez de se lançar no esfrega-refrega com as meninas, se acabrunhava nas penumbras e, pior ainda, escrevia versos. O que se passava: mariquice intelectual? Ou carburador entupido, avarias dessas que a vida do homem se queda em ponto morto?
Dona Serafina defendeu o filho e os estudos. O pai, conformado, exigiu: então, ele que fosse examinado.
— O médico que faça revisão geral, parte mecânica, parte eléctrica.
Queria tudo. Que se afinasse o sangue, calibrasse os pulmões e, sobretudo, lhe espreitassem o nível do óleo na figadeira. Houvesse que pagar por sobressalentes, não importava. O que urgia era pôr cobro àquela vergonha familiar.
Olhos baixos, o médico escutou tudo, sem deixar de escrevinhar num papel. Aviava já a receita para poupança de tempo. Com enfado, o clínico se dirigiu ao menino:
— Dói-te alguma coisa?
—Dói-me a vida, doutor.
O doutor suspendeu a escrita. A resposta, sem dúvida, o surpreendera. Já Dona Serafina aproveitava o momento: Está a ver, doutor? Está ver? O médico voltou a erguer os olhos e a enfrentar o miúdo:
— E o que fazes quando te assaltam essas dores?
— O que melhor sei fazer, excelência.
— E o que é?
— É sonhar.
Serafina voltou à carga e desferiu uma chapada na nuca do filho. Não lembrava o que o pai lhe dissera sobre os sonhos? Que fosse sonhar longe! Mas o filho reagiu: longe, porquê? Perto, o sonho aleijaria alguém? O pai teria, sim, receio de sonho. E riu-se, acarinhando o braço da mãe.
O médico estranhou o miúdo. Custava a crer, visto a idade. Mas o moço, voz tímida, foi-se anunciando. Que ele, modéstia apartada, inventara sonhos desses que já nem há, só no antigamente, coisa de bradar à terra. Exemplificaria, para melhor crença. Mas nem chegou a começar. O doutor o interrompeu:
— Não tenho tempo, moço, isto aqui não é nenhuma clinica psiquiátrica.
A mãe, em desespero, pediu clemência. O doutor que desse ao menos uma vista de olhos pelo caderninho dos versos. A ver se ali catava o motivo de tão grave distúrbio. Contrafeito, o médico aceitou e guardou o manuscrito na gaveta. A mãe que viesse na próxima semana. E trouxesse o paciente.
Na semana seguinte, foram os últimos a ser atendi dos. O médico, sisudo, taciturneou: o miúdo não teria, por acaso, mais versos? O menino não entendeu.
— Não continuas a escrever?
— Isto que faço não é escrever, doutor. Estou, sim, a viver. Tenho este pedaço de vida — disse, apontando um novo caderninho — quase a meio.
O médico chamou a mãe, à parte. Que aquilo era mais grave do que se poderia pensar. O menino carecia de internamento urgente.
— Não temos dinheiro — fungou a mãe entre soluços.
— Não importa — respondeu o doutor.
Que ele mesmo assumiria as despesas. E que seria ali mesmo, na sua clínica, que o menino seria sujeito a devido tratamento. E assim se procedeu.
Hoje quem visita o consultório raramente encontra o médico. Manhãs e tardes ele se senta num recanto do quarto onde está internado o menino. Quem passa pode escutar a voz pausada do filho do mecânico que vai lendo, verso a verso, o seu próprio coração. E o médico, abreviando silêncios:
— Não pare, meu filho. Continue lendo...
— É sonhar.
Serafina voltou à carga e desferiu uma chapada na nuca do filho. Não lembrava o que o pai lhe dissera sobre os sonhos? Que fosse sonhar longe! Mas o filho reagiu: longe, porquê? Perto, o sonho aleijaria alguém? O pai teria, sim, receio de sonho. E riu-se, acarinhando o braço da mãe.
O médico estranhou o miúdo. Custava a crer, visto a idade. Mas o moço, voz tímida, foi-se anunciando. Que ele, modéstia apartada, inventara sonhos desses que já nem há, só no antigamente, coisa de bradar à terra. Exemplificaria, para melhor crença. Mas nem chegou a começar. O doutor o interrompeu:
— Não tenho tempo, moço, isto aqui não é nenhuma clinica psiquiátrica.
A mãe, em desespero, pediu clemência. O doutor que desse ao menos uma vista de olhos pelo caderninho dos versos. A ver se ali catava o motivo de tão grave distúrbio. Contrafeito, o médico aceitou e guardou o manuscrito na gaveta. A mãe que viesse na próxima semana. E trouxesse o paciente.
Na semana seguinte, foram os últimos a ser atendi dos. O médico, sisudo, taciturneou: o miúdo não teria, por acaso, mais versos? O menino não entendeu.
— Não continuas a escrever?
— Isto que faço não é escrever, doutor. Estou, sim, a viver. Tenho este pedaço de vida — disse, apontando um novo caderninho — quase a meio.
O médico chamou a mãe, à parte. Que aquilo era mais grave do que se poderia pensar. O menino carecia de internamento urgente.
— Não temos dinheiro — fungou a mãe entre soluços.
— Não importa — respondeu o doutor.
Que ele mesmo assumiria as despesas. E que seria ali mesmo, na sua clínica, que o menino seria sujeito a devido tratamento. E assim se procedeu.
Hoje quem visita o consultório raramente encontra o médico. Manhãs e tardes ele se senta num recanto do quarto onde está internado o menino. Quem passa pode escutar a voz pausada do filho do mecânico que vai lendo, verso a verso, o seu próprio coração. E o médico, abreviando silêncios:
— Não pare, meu filho. Continue lendo...
Mia Couto nasceu na Beira, em Moçambique, em 1955. Foi
jornalista e atualmente é professor e biólogo. É sócio correspondente, eleito
em 1998, da Academia Brasileira de Letras, sendo sexto ocupante da cadeira 5,
que tem por patrono Dom Francisco de Sousa. Como biólogo, dirige a Avaliações
de Impacto Ambiental, IMPACTO Lda., empresa que faz estudos de impacto
ambiental, em Moçambique. Mia Couto tem realizado pesquisas em diversas áreas,
concentrando-se na gestão de zonas costeiras. Além disso, é professor da
cadeira de ecologia em diversos cursos da Universidade Eduardo Mondlane (UEM).
Grupo Gorilas
O dia em que explodiu Mabata-bata
Mia Couto
De repente, o boi explodiu. Rebentou sem um múúú. No capim em volta
choveram pedaços e fatias, grãos e folhas de boi. A carne eram borboletas
vermelhas. Os ossos eram moedas espalhadas. Os chifres ficaram num qualquer
ramo, balouçando a imitar a vida, no invisível do vento.
O espanto não cabia em Azarias, o pequeno pastor. Ainda há um instante
ele admirava o grande boi malhado, chamado de Mabata-bata. O bicho pastava mais
vagaroso que a preguiça. Era o maior da manada, régulo da chifraria, e estava
destinado como prenda de lobolo[1] do tio Raul,
dono da criação. Azarias trabalhava para ele desde que ficara órfão. Despegava
antes da luz para que os bois comessem o cachimbo[2] das
primeiras horas.
Olhou a desgraça: o boi poeirado, eco de silêncio, sombra de nada.
“Deve ser foi um relâmpago.” Pensou
Mas relâmpago não podia. O céu estava liso, azul sem mancha. De onde
saíra o raio? Ou foi a terra que relampejou?
Interrogou o horizonte, por cima das árvores. Talvez o ndlati, a vê do relâmpago,
ainda rodasse os céus. Apontou os olhos na montanha em frente. A morada do
ndlati era ali, onde se juntam os todos rios para nascerem da mesma vontade da
água. O nadlati vive nas suas quatro cores escondidas e só destapa quando as
nuvens rugem na rouquidão do céu. É então que o nadlati sobe aos céus,
enlouquecido. Nas alturas se veste de chamas, e lança o seu vôo incendiado
sobre os seres da terra. Às vezes atira-se no chão, buscando-o. Fica na cova e
aí deita a sua urina.
Uma vez foi preciso chamar as ciências do velho feiticeiro para escavar
aquele ninho e retirar os ácidos depósitos. Talvez o Mabata-bata pisara uma
réstia maligna do ndlati. Mas quem podia acreditar? O tio, não. Havia de querer
ver o boi falecido, ao menos ser apresentado uma prova do desastre. Já conhecia
bois relampejados: ficavam corpos queimados, cinzas arrumadas a lembrar o
corpo. O fogo mastiga, não engole de uma só vez, conforme sucedeu-se.
Reparou em volta: os outros bois, assustados, espalharam-se pelo mato. O
medo escorregou dos olhos do pequeno pastor.
— Não apareças sem um boi, Azarias. Só digo: é melhor nem
apareceres.
A ameaça do tio soprava-lhe aos ouvidos. Aquela angústia comia-lhe o ar
todo. Que podia fazer? Os pensamentos corriam-lhe como sombra mas não encontravam
saída. Havia uma só solução: era fugir, tentar os caminhos onde não havia mais
nada. Fugir é morrer de um lugar e ele, com os seus calções rotos, um saco
velho a tiracolo, que saudade deixava? Maus-tratos, atrás dos bois. Os filhos
dos outros tinham direito da escola. Ele não, não era filho. O serviço
arrancava-o cedo da cama e devolvia-o ao sono quando dentro dele já não havia
resto de infância. Brincar era só com os animais: nadar o rio na boleia do rabo
do Mabata-bata, apostar nas brigas dos mais fortes. Em casa, o tio
adivinhava-lhe o futuro:
— Este, de maneira que vive misturado com a criação há de casar
com uma vaca.
E todos se riam, sem quererem saber da sua alma pequenina, dos seus
sonhos maltratados. Por isso, olhou sem pena para o campo que ia deixar.
Calculou o dentro do seu saco: uma fisga[3], frutos do
djambalau[4], um canivete enferrujado. Tão pouco não
pode deixar saudade. Partiu na direção do rio. Sentia que não fugia: estava
apenas a começar o seu caminho. Quando chegou ao rio, atravessou a fronteira da
água. Na outra margem parou à espera nem sabia de quê.
Ao fim da tarde a avó Carolina esperava Raul à porta de casa. Quando
chegou ela disparou a aflição:
— Essa horas e o Azarias ainda não chegou com os bois.
— O quê? Esse malandro vai apanhar muito bem, quando chegar.
— Não é que aconteceu uma coisa, Raul? Tenho medo, esses
bandidos...
— Aconteceu brincadeiras dele, mais nada.
Sentaram na esteira e jantaram. Falaram das coisas do lobolo, preparação
do casamento. De repente, alguém bateu à porta. Raul levantou-se interrogando
os olhos da avó Carolina. Abriu a porta: eram os soldados, três.
— Boa noite, precisam alguma coisa?
— Boa noite. Vimos comunicar o acontecimento: rebentou uma mina esta
tarde. Foi um boi que pisou. Agora, esse boi pertencia daqui.
Outro soldado acrescentou:
— Queremos saber onde está o pastor dele.
— O pastor estamos à espera — respondeu Raul. E vociferou:
— Malditos bandos!
— Quando chegar queremos falar com ele, saber como foi sucedido.
É bom ninguém sair na parte da montanha. Os bandidos andaram espalhar minas
nesse lado.
Despediram. Raul ficou, rodando à volta das suas perguntas. Esse sacana
do Azarias onde foi? E os outros bois andariam espalhados por aí?
— Avó eu não posso ficar assim. Tenho que ir ver onde está esse
malandro. Deve ser talvez deixou a manda fugentar-se. É preciso juntar os bois
enquanto é cedo.
— Não podes, Raul. Olha os soldados o que disseram. É perigoso.
Mas ele desouviu e meteu-se pela noite. Mato tem subúrbio? Tem: é onde o
Azarias conduzia animais, Raul, rasgando-se nas micais[5],
aceitou a ciência do miúdo[6]. Ninguém com ele na
sabedoria da terra. Calculou que o pequeno pastor escolhera refugiar-se no
vale.
Chegou ao rio e subiu às grandes pedras. A voz superior, ordenou:
— Azarias, volta. Azarias!
Só o rio respondia, desenterrando a sua voz corredeira. Nada em toda à
volta. Mas ele adivinhava a presença oculta do sobrinho.
— Apareça lá, não tenhas medo. Não vou-te bater, juro.
Jurava mentiras. Não ia bater: ia matar-lhe de porrada, quando acabasse
de juntar os bois. No enquanto escolheu sentar, estátua de escuro. Os olhos,
habituados à penumbra, desembarcaram na outra margem. De repente, escutou
passos no mato. Ficou alerta.
— Azarias?
Não era. Chegou-lhe a voz de Carolina.
— Sou eu, Raul!
Maldita velha, que vinha ali fazer? Trapalhar só. Ainda pisava na mina,
rebentava-se e, pior, estourava com ele também.
— Volta em casa, avó!
— O Azarias vai negar de ouvir quando chamares. A mim, há-de
ouvir.
E aplicou sua confiança, chamando o pastor. Por trás das sombras, uma
silhueta deu aparecimento.
— És tu, Azarias. Volta comigo, vamos para casa.
— Não quero, vou fugir.
O Raul foi descendo, gatinhoso, pronto para saltar e agarrar as goelas
do sobrinho.
— Vais fugir para onde, meu filho?
— Não tenho aonde, avó.
— Esse gajo[7] vai voltar nem que eu
lhe chamboqueie[8] até partir-se dos bocados —
precipitou-se a voz rasteira de Raul.
— Cala-te, Raul. Na tua vida nem sabes da miséria. — E
voltou-se para o pastor: — Anda meu filho, só vens comigo. Não tens
culpa do boi que morreu. Anda ajudar o teu tio juntar os animais.
— Não é preciso. Os bois estão aqui, perto comigo.
Raul ergueu-se, desconfiado. O coração batucava-lhe o peito.
— Como é? Os bois estão aí?
— Sim, estão.
Enroscou-se o silêncio. O tio não estava certo da verdade do Azarias.
— Sobrinho: fizeste mesmo? Juntaste os bois?
A avó sorria pensando no fim das brigas daqueles dois. Prometeu um
prémio e pediu ao miúdo que escolhesse.
— O teu tio está muito satisfeito. Escolhe. Há-de respeitar o
teu pedido.
Raul achou melhor concordar com tudo, naquele momento. Depois, emendaria
as ilusões do rapaz e voltariam as obrigações do serviço das pastagens.
— Fala o seu pedido.
— Tio: próximo ano posso ir na escola?
Já adivinhava. Nem pensar. Autorizar a escola era ficar sem guia para os
bois. Mas o momento pedia fingimento e ele falou de costas para o pensamento:
— Vais, vais.
— Quantas bocas tenho, afinal?
— Posso continuar ajudar nos bois. A
escola só frequentamos da parte de tarde.
— Está certo. Mas tudo isso falamos
depois. Anda lá daqui.
O pequeno pastor saiu da sombra e
correu o areal onde o rio dava passagem. De súbito, deflagrou um clarão,
parecia o meio-dia da noite. O pequeno pastor engoliu aquele todo vermelho, era
o grito do fogo estourando. Nas migalhas da noite viu descer o ndlati, a ave do
relâmpago. Quis gritar:
— Vens pousar quem, ndalati?
Mas nada não falou. Não era o rio que
afundava suas palavras: era um fruto vazando de ouvidos, dores e cores. Em
volta tudo fechava, mesmo o rio suicidava sua água, o mundo embrulhava o chão
nos fumos brancos.
— Vens pousar a avó, coitada
tão boa? Ou preferes no tio, afinal das contas, arrependido e prometente como o
pai verdadeiro que morreu-me?
E antes que a ave do fogo se decidisse
Azarias correu e abraço-a na viagem da sua chama.
Grupo Gnu
O LEÃO E O COELHO SALTITÃO
Certa tarde, o Leão, rei da Floresta Grande, estava esfomeado e cansado
de comer ervas e peixe-seco. Chamou o seu amigo Coelho Saltitão para resolver
este problema da fome.
– Meu grande amigo Coelho – cumprimentou o Leão.
– Leão, meu velho... Como vai essa saúde?
– A saúde vai mais ou menos... O pior é a fome. Não aguento mais comer
raízes e frutos que não sabem a nada. Apetece-me carne, carne fresca e
abundante. Entendes?
– Entendo, meu velho – respondia o Coelho Saltitão, sempre mantendo
alguma distância do Leão, não fosse o rei querer resolver o problema do seu
apetite com carne de coelho amigo.
– Chega-te mais perto de mim – pediu o Leão.
– Não, obrigado, meu velho, estou bem a esta distância. Além disso, hoje
faz muito calor, não há necessidade de estarmos muito chegados. Mandaste
chamar-me?
– Sim – disse o Leão, enquanto passava a língua pelos lábios, molhando
os seus velhos bigodes. – Pensei que talvez tivesses uma ideia para arranjar
alguma carne fresca. Tu és um animal cheio de ideias.
O Coelho deu dois saltinhos e afastou-se um pouco mais. Estava
pensativo, mexia as patas esgravatando o chão em busca de qualquer bichinho que
não apareceu.
– Sim, tenho uma ideia, meu velho.
– Tens de chegar mais perto, quase não te escuto – disse o Leão.
– Então eu falo mais alto – respondeu o Coelho Saltitão.
– Mas não grites, pois outros animais poderão ouvir o teu plano. A
sério, podes chegar mais perto que eu não gosto de carne de coelho – garantiu o
Leão.
– Nunca digas desta carne não comerei – murmurou o Coelho Saltitão, mas
lá deu dois saltinhos aproximando-se do rei da Floresta Grande.
O Coelho explicou ao Leão que era uma boa ideia prepararem um lugar
apertado, com paus altos, como se fosse um pequeno quintal, onde ele, o Coelho,
faria o enterro do seu cão. Depois convidariam todos os animais da Floresta
Grande para virem ao funeral e...
– Mas tu tens um cão? – interrompeu o Leão, muito espantado.
– Não, claro que não.
– Então como é que o vais enterrar?
– Não entendes, meu velho... O cão és tu – sorriu o Coelho Saltitão.
– Então eu não sou o Leão?! – o rei da Floresta coçou a testa.
– Deixa-me terminar, meu velho, a ver se entendes o plano. Eu digo que
tinha um cão, e que o meu cão morreu de fome. Convido-os para um enterro
daqueles que nós fazemos aqui na nossa Floresta, com muita bebida. Tu ficas
quieto como se fosses o cão morto. Quando todos estiverem bêbados e
adormecerem, finalmente teremos uma bela refeição e ainda vai sobrar carne para
muitos meses.
– Mas tu comes carne? – perguntou o Leão.
– Ando um pouco cansado de cenouras – explicou o Coelho.
Grupo Lince
O gato e o escuro
Vejam, meus filhos, o gatinho preto, sentado no cimo desta história.
Pois ele nem sempre foi dessa cor.
Conta a mãe dele que, antes, tinha sido amarelo, às malhas e às pintas.
Todos lhe chamavam o Pintalgato.
Diz-se que ficou desta aparência, em totalidade negra, por motivo de um
susto.
Vou aqui contar como aconteceu essa trespassagem de claro para escuro.
O caso, vos digo, não é nada claro.
Aconteceu assim:
o gatinho gostava de passear-se nessa linha onde o dia faz fronteira com
a noite.
Faz de conta o pôr do Sol fosse um muro.
Faz mais de conta ainda os pés felpudos pisassem o poente.
A mãe se afligia e pedia:
- Nunca atravesse a luz para o lado de lá.
Essa era a aflição dela, que o seu menino passasse além do pôr de algum
Sol. O filho dizia que sim, acenava consentindo.
Mas fingia obediência.
Porque o Pintalgato chegava ao poente e espreitava o lado de lá.
Namoriscando o proibido, seus olhos pirilampiscavam.
Certa vez, inspirou coragem e passou uma perna para o lado de lá, onde a
noite se enrosca a dormir.
Foi ganhando mais confiança e, de cada vez, se adentrou um bocadinho.
Até que a metade completa dele já passara a fronteira, para além do
limite.
Quando regressava de sua desobediência, olhou as patas dianteiras e se
assustou.
Estavam pretas, mais que breu.
Escondeu-se num canto, mais enrolado que o pangolim.
Não queria ser visto em flagrante escuridão.
Mesmo assim, no dia seguinte, ele insistiu na brincadeira.
E passou mesmo todo inteiro para o lado de além da claridade.
À medida que avançava seu coração tiquetaqueava.
Temia o castigo. Fechou os olhos e andou assim, sobrancelhado, noite
adentro. Andou, andou, atravessando a imensa noitidão.
Só quando desaguou na outra margem do tempo ele ousou despersianar os
olhos. Olhou o corpo e viu que já nem a si se via. Que aconteceu? Virara cego?
Por que razão o mundo se embrulhava num pano preto?
Chorou.
Chorou.
E chorou.
Pensava que nunca mais regressaria ao seu original formato.
Foi então que ouviu uma voz dizendo:
- Não chore, gatinho.
- Quem é?
- Sou eu, o escuro. Eu é que devia chorar porque olho tudo e não vejo
nada.
Sim, o escuro, coitado. Que vida a dele, sempre afastado da luz!
Não era de sentir pena? Por exemplo, ele se entristecia de não enxergar
os lindos olhos do bichano. Nem os seus mesmo ele distinguia, olhos pretos em
corpo negro. Nada, nem a cauda nem o arco tenso das costas. Nada sobrava de sua
anterior gateza.
E o escuro, triste, desabou em lágrimas.
Estava-se naquele desfile de queixas quando se aproximou uma grande
gata. Er a mãe do gato desobediente. O gatinho Pintalgato se arredou, receoso
que a mãe lhe trouxesse um castigo. Mas a mãe estava ocupada em consolar o
escuro. E lhe disse:
- Pois eu dou licença a teus olhos:
fiquem verdes, tão verdes que amarelos.
E os olhos do escuro de amarelaram. E se viram escorrer, enxofrinhas,
duas lagriminhas amarelas em fundo preto.
O escuro ainda chorava:
- Sou feio. Não há quem goste de mim.
- Mentira, você é lindo. Tanto como os outros.
- Então porque não figuro nem no arco-íris?
- Você figura no meu arco-íris.
- Os meninos têm medo de mim. Todos têm medo do escuro.
- Os meninos não sabem que o escuro só existe é dentro de nós.
- Não entendo, Dona Gata.
- Dentro de cada um há o seu escuro. E nesse escuro só mora quem lá
inventamos. Agora me entende?
- Não estou claro, Dona Gata.
- Não é você que me te medo. Somos nós que enchemos o escuro com nosso
medos.
A mãe gata sorriu bondades, ronronou ternuras, esfregou carinho no corpo
do escuro.
E foram carícias que ela lhe dedicou, muitas e tantas que o escuro
adormeceu. Quando despertou viu que as suas costas estavam das cores todas da
luz.
Metade do seu corpo brilhava, arco-iriscando. Afinal?
O espanto ainda o abraçava quando escutou a voz da gata grande:
- Você quer ser meu filho?
O escuro se encolheu, ataratonto.
Filho?
Mas ele nem chegava a ser coisa alguma, nem sequer antecoisa.
- Como posso ser seu filho se eu nem sou gato?
- E quem lhe disse que não é?
E o escuro sacudiu o corpo e sentiu a cauda, serpenteando o espaço.
Esticou a perna e viu brilhar as unhas, disparadas como repentinas lâminas.
O Pintalgato até se arrepiou, vendo um irmão tão recente.
- Mas, mãe:
sou irmão disso aí?
- Duvida, Pintalgatito?
Pois vou-lhe provar que sou mãe dos dois.
Olhe bem para os meus olhos e verá.
Pintalgato fitou o fundo dos olhos da sua mãe, como se se debruçasse num
poço escuro. De rompante, quase se derrubou, lhe surgiu como que um relâmpago
atravessando a noite.
Pintalgato acordou, todo estremolhado, e viu que, afinal, tudo tinha
sido um sonho. Chamou pela mãe. Ela se aproximou e ele notou seus olhos, viu
uma estranheza nunca antes reparada. Quando olhava o escuro, a mãe ficava com
os olhos pretos. Pareciam encheram de escuro. Como se engravidassem de breu, a
abarrotar de pupilas.
Ante a luz, porém, seus olhos todos se amarelavam, claros e luminosos,
salvo uma estreitinha fenda preta.
Então, o gatinho Pintalgato espreitou nessa fenda escura como se
vislumbrasse o abismo.
Por detrás dessa fenda o que é que ele viu?
Adivinham?
Pois ele viu um gato preto, enroscado do outro lado do mundo.
Grupo Adaezas
O QUARTO ANJO, conto de
José Eduardo Agualusa
Após criar o primeiro anjo, Deus ofereceu-lhe um poderoso par de asas.
Explicou-lhe que aquilo era mais um aparato de fé do que de voo.
- Os pássaros – assegurou-lhe – voam por convicção.
O anjo viu como voavam os pássaros, batendo as asas e recolhendo as
pernas, e imitou-os. Ao fim de cinco meses tinha ganho uma certa prática e até
já conseguia fazer algumas piruetas, incluindo voo picado seguido de um duplo
mortal invertido. Não era ainda uma águia, mas também não poderia ser
confundido com uma galinha. Enfim, voava.
- Agora tira-as. – Disse-lhe então Deus, que o observara, em silêncio, a
uma distância discreta, durante todos aqueles dias. – Tira as asas e voa.
O anjo olhou para Ele incrédulo. Protestou:
- E eu lá sou doido, ó Deus?! Tiro porra nenhuma!
Deus, o qual, como se sabe, é brasileiro, não estranhou nem que o anjo
falasse português, nem sequer o forte sotaque carioca. A língua e o sotaque
aprendera-as com Ele. Compreendeu, todavia, que lhe faltava o essencial, a fé,
além de uma educação um pouco mais esmerada, pois, bem vistas as coisas,
tratava-se de um anjo, ainda que numa fase de iniciação, e num rápido gesto de
enfado, descriou-o.
O segundo anjo era, sem dúvida, um sujeito mais cordato e delicado.
Muito loiro e frágil. Muitíssimo anjo. Tinha um cabeleira comprida, que gostava
de trazer sempre limpa e entrançada, num gracioso rabo-de-cavalo. Aprendeu a
voar mais depressa do que o primeiro, com uma técnica original, que deixava os
pássaros envergonhados. Porém, quando Deus lhe pediu que tirasse as asas e se
lançasse assim, inteiramente nu, de um penhasco altíssimo, também ele recusou.
- Ai Deus! Saiba o Senhor que isso eu não faço. Com o seu perdão, faço
qualquer coisa, qualquer coisa, entende?, faço qualquer coisa mas isso não
faço, não.
Disse aquilo com voz trémula e humilde, sem sombra de arrogância, de forma
que o Criador se apiedou dele e o deixou ir. O anjo pintou as asas de
cor-de-rosa choque e juntou-se a um bando de flamingos. Dizem que ainda hoje é
possível ver, em certos crepúsculos inflamados, nalgum palude perdido de
África, um anjo voando, com singular elegância, entre uma nuvem de flamingos.
Voando e rindo. Eu nunca o vi, mas pode ser.
O terceiro anjo fê-lo Deus mais prático e destemido. Usava um bigode
curvo e era respeitoso e de poucas palavras. Voava sem esforço, mas também sem
agrado. Pousava nos ramos das mangueiras, ou de outras árvores igualmente altas
e frondosas, e era capaz de ficar por ali sentado, tardes inteiras, a cofiar o
forte bigode, a comer mangas e a fruir a sombra fresca e o canto das aves.
Quando Deus lhe pediu que subisse ao penhasco e que tirasse as asas e saltasse,
não o contestou. Não disse nada. Voou até ao penhasco, tirou as asas e saltou.
Ficou claro, naquele trágico instante, que o que lhe sobrava em disciplina,
faltava-lhe em fé. Ou melhor, como Deus lhe tentou explicar enquanto ele caía,
vertiginosamente, de encontro ao gume feroz das rochas, lá muito em baixo, o
problema é que colocara toda a sua fé no instrumento ao invés de a colocar no
objectivo. O impacto foi devastador.
O Senhor Deus ficou desgostoso com o novo desaire. Levou muito tempo a
recuperar-se. Por fim tentou de novo. Saiu-lhe, à quarta tentativa, um anjo
alegre, até um pouco simplório, que gostava sobretudo de cantar e de dançar,
artes, aliás, que ele próprio havia inventado. Para voar não precisava possuir
grande talento. Todavia, quando Deus lhe sugeriu que tirasse as asas e tentasse
voar sem elas, usando o esforço da fé, ele apenas perguntou, atordoado:
- E é possível?
Depois largou as asas, espreitou o fundo abismo, fechou os olhos, e
imaginou que por dentro do seu corpo outras asas se desenrolavam e batiam. Foi
com essas, um tanto torto, um outro tanto tonto, que se ergueu no céu.
Deus alegrou-se. Depois dele fez muitos outros anjos, legiões e legiões,
mas poucos, muito poucos foram capazes de imitar o número quatro. Diz-se que
esse anjo sem asas se passeia entre nós, como uma espécie de agente secreto. Um
observador num campo de batalha. Uma testemunha incógnita.
Provavelmente o anjo número dois é mais feliz.
Grupo Hiena
“Velho Caxombo sonhou com o mar”
conto de Agualusa
Ataque de Quissondes – um dos laboratórios experimentais do ilustre
professor Carlos Eduardo Noronha de Mello e Silva Franco, na Quissama, foi
completamente devastado por um ataque de formiga vermelha. Segundo o professor
Silva Franco, que se encontra em Angola ao serviço da Real Sociedade Britânica
de Zoologia, os quissondes devoraram uma colecção de ofídios embalsamados que
lhe haviam demorado oito anos a completar. No desastre pereceu ainda o guarda
do laboratório.
in “A Gazeta de Loanda” de 20 de Março 1901
Na última tarde da sua vida, quando depois do costumeiro almoço de fungi
e quizaca se estendeu na esteira para gozar a sesta, o velho Caxombo sonhou com
o mar. Mas ao acordar já não se lembrava disso, e mesmo que se lembrasse não
teria atribuído ao facto importância alguma. Para ele, que fora criado por um
branco e pensava em português, o mar era apenas o mar.
Assim, e até quase à hora do sol-pôr, esse dia foi para o velho Caxombo
igual a todos os outros. Já há oito anos tinha aquele emprego como guarda de
uma pequena estação de empalhamento de cobras, em pleno sertão da Quissama.
Fora o professor Silva Franco que lhe obtivera o lugar, salvando-o assim de
morrer na miséria, pois Caxombo estava a dobrar o cabo dos sessenta e deixara
de poder exercer com a agilidade requerida o seu antigo mister de carregador de
machilas. Agora envelhecia tranquilamente, entregue à íntima e minuciosa tarefa
de imaginar a sua própria morte. Via-se a morrer de muitas maneiras, convicto
de que se as conseguisse idear a todas nenhuma delas se concretizaria. Mas, a
despeito de tal obsessão, não intuiu nem naquele dia nem nos que o precederam
quaisquer sinais aziagos.
Ao velho Caxombo aquele ofício de guarda pesava pouco, pois a Estação
situava-se em lugar remoto e o gentio das redondezas era pacato e sem cobiça.
De tempos a tempos o professor Silva Franco aparecia no local, acompanhado por
um mulato de nome Souza, e nessas alturas o velho Caxombo ajudava os dois a
bater o mato à caça de cobras raras. Mas a amior parte dos dias passava-os ele
sem ocupação alguma, entretido tão-somente a imaginar as circunstâncias em que
ocorreria o seu próprio falecimento.
Naquela tarde, portanto, o velho Caxombo despertou de sua sesta com a
quietude de sempre e sem se lembrar que sonhara com o mar. O sol declinava
quando, numa angústia crescente, se deu conta de que qualquer coisa estava
errada. Qualquer coisa estava errada e ele não sabia o que era. De súbito
compreendeu: o silêncio enchia tudo. Um silêncio espesso como uma noite sem
lua. Não havia pássaros. Todos os pássaros se tinham ido embora.
O velho Caxombo saiu para o meio do capinzal fazendo um enorme esforço
para escutar fosse o que fosse. Ao princípio conseguia apenas distinguir o
sussurro da brisa a enroscar-se no capim. Depois, pouco a pouco, começou a
perceber um crepitar abafado; um ruído distante mas cada vez mais firme.
Trepou a custo até ao topo de um morrozinho fronteiro e daí alargou os
olhos pela planície. Na direção de onde vinha o ruído o capim arfava, para
baixo e para cima, animado por uma força que não podia ser a do vento.
“Quissondes!”, exclamou o velho. E viu-os um por um, milhões de pequenos
assassinos ansiosos, a progredirem, rápida e inexoravelmente em direção a si.
Primeiro ocorreu-lhe lançar fogo ao sertão. Mas era a época das chuvas e o
capim estava verde, dificilmente arderia. Fugir também não era possível. Ele estava
velho, muito velho e o corpo não suportaria o esforço. “Aqui está”, pensou
desesperado, “uma morte que nunca imaginei.”. Entrou para dentro de casa e
fechou a porta. “Não!”, gritou alto e com raiva, “não vou morrer assim!”.
Dentro em pouco as formigas começariam a penetrar por baixo da porta,
pela janela quebrada, por todas as fendas, buracos e interstícios da pequena
casa. “Resta-me pouco tempo”, murmurou o velho, e pôs-se a procurar no armário
um veneno qualquer. Se tinha de morrer morreria ao menos de uma forma rápida e
menos estúpida. Então, de repente, deu com o garrafão de ácido sulfúrico e
começou a rir. Não, não morreria! Sempre a rir pegou em quatro alguidares, dos
grandes, colocou cada um deles debaixo dos pés da pesada mesa da sala, e distribuiu
por todos o conteúdo do garrafão. Depois, serviu-se generosamente de vinho, de
fungi e de peixe seco e trepou para o tampo da mesa, disposto a enfrentar o
cerco dos quissondes.
Os primeiros apareceram por debaixo da porta, isolados e tontos,
farejando o ar com as compridas antenas. Corriam em círculos, paravam e corriam
de novo, e o velho Caxombo conseguia ver distintamente a forma como moviam as
pinças, entrechocando-as, como um açougueiro a amolar as facas.
Desvairadas com a presença do velho trepavam aos montões pelos
alguidares, para logo recuarem, atingidas pelas emanações do ácido. Caxombo,
com uma garrafa de vinho na mão, ria-se em gargalhadas histéricas, cuspia nas
formigas e troçava delas: “Ninguém come o velho Caxombo”, gritava com o gargalo
meio enfiado na boca, o vinho escorrendo-lhe pelo queixo, “Caxombo é muito mais
espertíssimo que as formigas…”.
Não foi.
Mas só demasiado tarde se apercebeu disso. Os quissondes haviam começado
a escalar as paredes e corriam decididos pelo teto, concentrando-se exatamente
por cima da mesa onde o velho continuava a rir e a beber. Ao dar por que as
formigas trepavam pelas paredes, Caxombo seguiu-lhes com os olhos o trajeto e o
riso morreu-lhe nos lábios, subitamente sem sangue. Os insetos tinham-se
enovelado em grades bolas sobre a sua cabeça e uma delas oscilava já, prestes a
cair. Então Caxombo dobrou-se sobre si mesmo, como um bicho-de-conta, e
enterrando a cabeça entre as mãos fechou os olhos.
“Estou a sonhar”, gemeu baixinho, “é claro que estou a sonhar.”.
José Eduardo Agualusa,
in A Feira dos assombrados e outras estórias verdadeiras e inverosímeis
Grupo Jongo
O não
desaparecimento de Maria Sombrinha
Afinal, quantos
lados tem o mundo no parecer dos olhos do camaleão?
Já muita coisa foi
vista neste mundo. Mas nunca se encontrou nada mais triste que caixão
pequenino. Pense-se, antemanualmente, que esta estória arrisca conter morte de
criança. Veremos a verdade dessa tristeza. Como diz o camaleão - em frente para
apanhar o que ficou para trás.
Deu-se o caso numa
família pobre, tão pobre que nem tinha doenças. Dessas em que se morre mesmo
saudável. Não sendo pois espantável que esta narração acabe em luto. Em todo o
mundo, os pobres têm essa estranha mania de morrerem muito. Um do mistérios dos
lares famintos é falecerem tantos parentes e a família aumentar cada vez mais.
Adiante, diria o camaleonino réptil.
A família de Maria
Sombrinha vivia em tais misérias, que nem queria saber de dinheiro. A moeda é o
grão de areia esfluindo entre os dedos? Pois, ali, nem dedos. Tudo começou com
o pai de Sombrinha. Ele se sentou, uma noite, à cabeceira da mesa. Fez as rezas
e olhou o tampo vazio.
- “Eh pá, esta
mesa está diminuir!”
Os outros, em
silêncio, balancearam a cabeça, em hipótese.
- “Vocês não estão
a ver? Qualquer dia não temos onde comer.”
Ao se preparar
para dormir, apontou o leito e chamou a mulher:
- “Esta cama cada
dia está mais pequena. Um dia desses não tenho onde deitar.”
Debateram o
assunto, timidamente, com o pai. Sugeriram que a razão pudesse ser inversa: o
mundo é que estava a aumentar, encurralando a aldeiazinha. Fosse o caso dessa
suposição, a aldeia estaria metida em vara de sete camisas. Mas o velho não
arredou ideia. Casmurrou contra argumento alheio, ancorado na teima dele.
Por fim, sua visão
minguante aconteceu com Sombrinha. Ele via o tamanho dela se acanhar, mais e
mais pequenita. E se queixava, pressentimental:
- “Esta menina
está-se a enxugar no poente...”
Todos se riam. O
pai cada vez piorava. Face ao riso, o homem se remeteu à ausência. Se
transferiu para as traseiras, se anichou entre desperdício e desembrulhos. A
filha ainda solicitou comparência do mais velho.
- “Deixe o seu
pai. lá onde está, ele não está em lugar nenhum.”
Valia a pena
sombrear a miúda, minhocar-lhe o juízo? Mas Sombrinha não deixou de rimar com a
alegria. Afinal, era ainda menos que adolescente, dada somente a brincriações.
Sendo ainda tão menina, contudo, um certo dia ela se barrigou, carregada de
outrem. Noutros termos: ela se apresentou grávida. Nove meses depois se
estreava a mãe. Sem ter idade para ser filha como podia desempenhar
maternidades?
A criancinha
nasceu, de simples escorregão, tão minusculinha que era. A menina pesava tão
nada que a mãe se esquecia dela em todo o lado. Ficava em qualquer canto sem
queixa nem choro.
- “Essa menina só
pára quieta!”, queixava-se Sombrinha.
Deram o nome à menininha:
Maria Brisa. Que ela nem vento lembrava, simples aragem. Dona mãe ralhava, mas
sem nunca fechar riso, tudo em disposições. Até que certa vez repararam em
Maria Brisa. Porque a barriguinha dela crescia, parecia uma lua em estação
cheia. Sombrinha ainda devaneou. Deveria ser um vazio mal digerido. Gases
crescentes, arrotos tontos. Mas depois, os seios lhe incharam. E concluíram, em
tremente arrepiação: a recém-nascida estava grávida! E, de facto, nem tardaram
os nove meses. Maria Brisa dava à luz e Maria Sombrinha ascendia a mãe e avó
quase em mesma ocasião. Sombrinha passou a tratar de igual seus rebentinhos - a
filha e a filha da filha. Uma pendendo em cada pequenino seio.
A família deu
conta, então, do que o pai antes anunciara: Sombrinha, afinal das contas,
sempre se confirmava regredindo. De dia para dia ela ia ficando sempre
menorzita. Não havia que iludir - as roupas iam sobrando, o leito ia crescendo.
Até que ficou do mesmo tamanho da filha. Mas não se quedou por ali. Continuou
definhando a pontos de competir com a neta.
Os parentes
acreditaram que ela já chegara ao mínimo mas, afinal, ainda continuava a
reduzir-se. Até que ficou do tamanho de uma unha negra. A mãe, as primas, as
tias a procuravam, agulha em capinzal. Encontravam-na em meio de um anónimo
buraco e lhe deixavam cair uma gotícula de leite.
- “Não deite de
mais que ainda ela se afoga!”
Até que, um dia, a
menina se extingiu, em idimensão. Sombrinha era incontemplável a vistas nuas.
Choraram os familiares, sem conformidade. Como iriam ficar as duas orfãzinhas,
ainda na gengivação de leite? A mãe ordenou que se fosse ao quintal e se
trouxesse o esquecido pai. O velho entrou sem entender o motivo do chamamento.
Mas, assim que passou a porta, ele olhou o nada e chamou, em encantado riso:
- “Sombrinha, que
faz você nessa poeirinha?”
E depois pegou
numa imperceptível luzinha e suspendeu-a no vazio dos braços. “Venha que eu vou
cuidar de si”, murmurou enquanto regressava para o quintal da casa, nas
traseiras da vida.
Grupo Príncipe
A viagem da
cozinheira lagrimosa
Antunes Correia e
Correia, sargento colonial em tempo de guerra. Se o nome era redundante, o
homem estava reduzido a metades. Pisara um chão traiçoeiro e subira pelas
alturas para esse lugares onde se deixa a alma e se trazem eternidades. Correia
não deixou nem trouxe, incompetente até para morrer. A mina que explodira era
pessoal. Mas ele, tão gordo, tão abastado de volume, necessitava de duas
explosões.
- “Estou morto por
metade. Fui visitado apenas por meia-morte.”
Perdera a vida só
num olho, um lado da cara todo desfacelado. O olho dele era faz-conta um peixe
morto no aquário do seu rosto. Mas o sargento era tão apático, tão sem
meximento, que não se sabia se de vidro era todo ele ou apenas o olho. Falava
com impulso de apenas meia-boca. Evitava conversas, tão doloroso que era
ouvir-se. Não apertava a mão a ninguém para não sentir nesse aperto o vazio de
si mesmo. Deixou de sair, cismado em visitar no obscuro da casa a antecâmara do
túmulo. O Correia perdera interesses na vida: ser ou não ser tanto lhe
desfazia. As mulheres passavam e ele nada. E ladainhava: ““estou morto por
metade”“.
Agora, reformado,
sozinho, mutilado de guerra e incapacitado de paz, Antunes Correia e Correia
tomava conta de suas lembranças. E se admirava do fôlego da memória. Mesmo sem
o outro hemisfério não havia momento que lhe escapasse nessa caçada ao passado.
“Das duas uma: ou minha vida foi muito enorme ou ela fugiu-me toda para o lado
direito da cabeça”. Para as recordações virem à tona ele inclinava o pescoço.
- “Assim
escorregavam directamente do coração”, dizia ele.
Felizminha era a
empregada do sargento. Trabalhava para ele desde a sua chegada ao bairro
militar. Nos vapores da cozinha a negra Felizminha arregaçava os olhos.
Enxugava a lágrima, sempre tarde. Já a gota tombara na panela. Era certo e
havido: a lágrima se adicionando nas comidas. Tanto que a cozinheira nem usava
tempero nem sal. O sargento provava a comida e se perguntava porquê tão
delicados sabores.
- “É comida
temperada a tristeza”.
Era a invariável
resposta de Felizminha. A empregada suspirava: “ai, se pudesse ser outra, uma
alguém”. Poupava alegrias, poucas que eram.
- “Quero guardar
contentamento para gastar depois, quando for mais velhinha”.
Metida a sombra,
fumo, vapores. Nem sua alma ela enxergava nada, embaciada que estava por
dentro. A mão tiritacteava no balcão. O recinto era escuro, ali se encerravam
voláteis penumbras. A cozinha é onde se fabrica a inteira casa.
Certa noite, o
patrão entrou na cozinha, arrastando seu peso. Esbarrou com a penumbra.
- “Você não quer
mais iluminação na porcaria desta cozinha?
- “Não, eu gosto
assim.”
O sargento olha
para ela. A gorda Felizminha remexe a sopa, relambe a colher, acerta o sal na
lágrima. O destino não lhe encomendou mais: apenas esse encontro de duas meias
vidas. Correia e Correia sabe quanto deve à mulher que o serve. Logo após o
acidente, ninguém entendia as suas pastosas falas. Carecia-se era de serviço de
mãe para amparar aquele branco mal-amanhado, aquele resto de gente. O sargento
garatunfava uns sons e ela entendia o que queria. Aos poucos o português
aperfeiçoou a fala, mais apessoado. Agora ele olha para ela como se estivesse
ainda em convalescença. O roçar da capulana dela amansa velhos fantasmas, a voz
dela sossega os medonhos infernos saídos da boca do fogo. Milagre é haver gente
em tempo de cólera e guerra.
- “Você está
magra, anda a apertar as carnes?
- “Magra?”
Pudesse ser! A
tartaruga: alguém a viu magrinha? Só os olhos lhe engordavam, barrigando de
bondades. A gorda Felizminha gemia tanto ao se baixar que parecia que a terra
estava mais longe que o pé.
- “Me esclareça
uma coisa, Felizminha: porquê essa choradice, todos os dias?
- “Eu só choro
para dar mais sabor aos meus cozinhados.
- “Ainda eu tenho
razões para tristezas, mas você...
- “Eu de onde vim
tenho lembrança é de coqueiros, aquele marejar das folhas faz conta a gente
está sempre rente ao mar. É só isso, patrão”.
A negra gorda
falou enquanto rodava a tampa do rapé, ferrugentia. O patrão meteu a mão no
bolso e retirou uma caixa nova. Mas ela recusou aceitar.
- “Gosto de coisa
velha, dessa que apodrece.
- “Mas você, minha
velha, sempre triste. Quer aumento no dinheiro?
- “Dinheiro, meu
patrão, é como lamina... corta dos dois lados. Quando contamos as notas se
rasga a nossa alma. A gente paga o quê com o dinheiro? A vida nos está cobrando
não o papel mas a nós, próprios. A nota quando sai já a nossa vida foi. O
senhor se encosta nas lembranças. Eu me amparo na tristeza para descansar”.
A gorda cozinheira
surpreendeu o patrão. Lhe atirou, a queimar-lhe a roupa:
- “Tenho ideia
para o senhor salvar o resto do seu tempo.
- “Já só tenho
metade de vida, Felizminha.
- “A vida não tem
metades. É sempre inteira”...
Ela
desenvolveu-se: o português que convidasse uma senhora, dessas para lhe
acompanhar. O sargento ainda tinha idade combinando bem com corpo. Até há essas
da vida, baratinhas, mulheres muito descartáveis.
- “Mas essas são
pretas e eu com pretas...
- “Arranje uma
branca, também há ai dessas de comprar. Estou-lhe a insistir, patrão. O senhor
entrou na vida por caminho de mulher. Chame outra mulher para entrar de novo”.
Correia e Correia
semi-sorriu, pensageiro.
Um dia o militar
saiu e andou a tarde toda fora. Chegou a casa, eufórico, se encaminhou para a
cozinha. E declarou com pomposidade:
- “Felizminha:
esta noite ponha mais um prato”.
A alma de
Felizminha se enfeitou. Esmerou na arrumação da sala, colocou uma cadeira do
lado direito do sargento para que ele pudesse apreciar por inteiro a visitante.
Na cozinha apurou a lágrima destinada a condimentar o repasto.
Aconteceu, porém,
que não veio ninguém. O lugar na mesa permaneceu vazio. Essa e todas as outras
vezes. _única mudança no cenário: o assento que competia à invindável visita
passava da direita para a esquerda, esse lado em que não havia mundo para o
sargento Correia.
Felizminha
duvidava: essas que o patrão convidava existiam, verídicas e autênticas?
Até que, uma
noite, o sargento chamou a cozinheira. Pediu-lhe que tomasse o lugar das
falhadas visitadoras.
Felizminha
hesitou. Depois, vagarosa, deu um jeito para caber na cadeira.
- “Decidi me ir
embora”.
Felizminha não
disse nada. Esperou o que restava para ser dito.
- “E quero que
você venha comigo.
- “Eu, patrão? Eu
não saio da minha sombra.
- “Vens e vês o
mundo.
- “Mas ir lá fazer
o quê, nessa terra...
- “Ninguém te vai
fazer mal, eu prometo”.
Daí em diante, ela
se preparou para a viagem. Animada com a ideia de ver outros lugares? Aterrada
com a ideia de habitar terra estranha, lugar de brancos? Nem rosto nem palavra
da cozinheira revelavam a substancia de sua alma. O sargento provava a refeição
e não encontrava mudança. Sempre o mesmo sal, sempre a mesma delicadeza de
sabor. No dia acertado, o militar acotovelou a penumbra da cozinha:
- “Venha, faça as
mulas”.
Saíram de casa e
Felizminha cabisbaixou-se ante o olhar da vizinhança. Então o sargento, perante
o público, deu-lhe a mão. Nem se entrecabiam bem de tão gordinhas, os dedos
escondendo-se como sapinhos envergonhados.
- “Vamos”, disse
ele.
Ela olhou os céus,
receosa por, daí a um pouco, subir em avião celestial, atravessar mundos e
oceanos. Entrou na velha carrinha, mas para seu espanto Correia não tomou a
direcção do aeroporto. Seguiu por vielas, curvas e areias. Depois, parou num
beco e perguntou:
- “Para que lado
fica essa terra dos coqueiros?”
Grupo Orix
A menina, as aves
e o sangue
Aconteceu, certa
vez, uma menina a quem o coração batia só de quando em enquantos. A mãe sabia
que o sangue estava parado pelo roxo dos lábios, palidez nas unhas. Se o
coração estancava por demasia de tempo a menina começava a esfriar e se cansava
muito. A mãe, então, se afligia: rola o dedo e deixava a unha intacta. Até que
o peito da filha voltava a dar sinal:
- “Mãe, venha
ouvir: está a bater!”
A mãe acorria,
debruçando a orelha sobre o peito estreito que soletrava pulsação. E pareciam,
as duas, presenciando pingo de água em pleno deserto. Depois, o sangue dela
voltava a calar, resina empurrando a arrastosa vida.
Até que, certa
noite, a mulher ganhou para o susto. Foi quando ela escutou os pássaros. Sentou
na cama: não eram só piares, chilreinações. Eram rumores de asas, brancos
drapejos de plumas. A mãe se ergueu, pé descalço pelo corredor. Foi ao quarto
da menina e joelhou-se junto ao leito. Sentiu a transpiração, reconheceu o seu
próprio cheiro. Quando lhe ia tocar na fronte a menina despertou:
- “Mãe, que bom,
me acordou! Eu estava sonhar pássaros”.
A mãe sortiu-se de
medo, aconchegou o lençol como se protegesse a filha de uma maldição. Ao tocar
no lençol uma pena se desprendeu e subiu, levinha, volteando pelo ar. A menina
suspirou e a pluma, algodão em asa, de novo se ergueu, rodopiando por alturas
do tecto. A mãe tentou apanhar a errante plumagem. Em vão, a pena saiu voando
pela janela. A senhora ficou espreitando a noite, na ilusão de escutar a voz de
um pássaro. Depois, retirou-se, adentrando-se na solidão do seu quarto. Dos
pássaros selou-se segredo, só entre as duas.
Mas o assunto do
coração suspenso foi sendo divulgado e chegaram ao subúrbio curiosos da cidade.
Vieram estudiosos a solicitar o caso daquele acaso. Até médicos questionavam a
mãe:
- “Angina de peito
ela teve?
- “Sim, doutor:
sempre ela foi anjinha de peito”.
Precisar de ajuda?
Que não, doutor, essa menina é feita assim mesmo, levinha como ar em pulmão de
ave. Mas o médico insiste, promete mundos sem fundos. Que a fenomenosa miúda podia
ficar em memória da ciência. Mas a senhora mãe deveria participar. Era preciso
tudo controlar: batimentos, calores, suspiros. Tarefa para mãe a tempo inteiro,
se pediam obséquios.
- “Se eu sei
contar, doutor? Só os padre-nossos e aves que nos mandam rezar na confissão”.
Por uns dias ela
ainda segurou o pulso frio da menina. Quase desejava que o peito não desse
resposta. Afinal, quando o coração lhe pulsava a menina esquentava-se, a ponto
de rubra febre. A filha resistia, com doçura: queria era sair, brincar.
- “Desde dois
dias, mãe. Desde isso que não bate”.
A senhora desistiu
das medições. Que a deixassem só, ela com ela. E, de noite, os pássaros
enchendo o escuro. A mãe expulsou os exteriores mirones. Fossem todos, levassem
seus títulos, promessas, indaguações.
Com o tempo,
porém, cada vez menos o coração se fazia frequente. Quase deixou de dar sinais
à vida. Até que essa imobilidade se prolongou por consecutivas demoras. A
menina falecera? Não se vislumbravam sinais dessa derradeiragem. Pois ela
seguia praticando vivências, brincando, sempre cansadinha, resfriorenta. Uma só
diferença se contava. Já à noite a mãe não escutava os piares.
- “Agora não
sonha, filha?
- “Ai mãe, está
tão escuro no meu sonho!”
Só então a mãe
arrepiou decisão e foi à cidade:
- “Doutor, lhe
respeito a permissão: queria saber a saúde de minha única. É seu peito... nunca
mais deu sinal”.
O médico corrigiu
os óculos como se entendesse rectificar a própria visão. Clareou a voz, para
melhor se autorizar. E disse:
- “Senhora, vou
dizer. a sua menina já morreu.
- “Morta, a minha
menina? Mas, assim...?
- “Esta é sua
maneira de estar morta”.
A senhora escutou,
mãos juntas, na educação do colo. Anuindo com o queixo, ia esbugolhando o
médico. Todo seu corpo dizia sim, mas ela, dentro do seu centro, duvidava.
Pode-se morrer assim com tanta leveza, que nem se nota a retirada da vida? E o
médico, lhe amparando, já na porta:
- “Não se
entristonhe, a morte é o fim sem finalidade”.
A mãe regressou a
casa e encontrou a filha entoando danças, cantarolando canções que nem existem.
Se chegou a ela, tocou-lhe como se a miúda inexistisse. A sua pele não
desprendia calor.
- “Então, minha
querida não escutou nada?”
Ela negou. A mãe
percorreu o quarto, vasculhou recantos. Buscava uma pena, o sinal de um
pássaro. Mas nada não encontrou. E assim, ficou sendo, então e adiante.
Cada vez mais
fria, a moça brinca, se aquece na torreira do sol. Quando acorda, manhã alta,
encontra flores que a mãe depositou ao pé da cama. Ao fim da tarde, as duas,
mãe e filha, passeiam pela praça e os velhos descobrem a cabeça em sinal de
respeito.
E o caso se vai
seguindo, estória sem história. Uma única, silenciosa, sombra se instalou: de
noite, a mãe deixou de dormir. Horas a fio sua cabeça anda em serviço de
escutar, a ver se regressam as vozearias das aves.
Grupo Pangolin
Oxalá cria a Terra
No começo, o mundo era todo pantanoso e cheio da água,
Um lugar inóspito, sem nenhuma serventia.
Acima dele havia o Céu, onde viviam Olorum e todos os orixás
Que às vezes desciam para brincar nos pântanos insalubres.
Desciam por teias de aranha pendurada no vazio.
Ainda não havia terra firme, nem o homem existia.
Um dia Olorum chamou à sua presença Oxalá, o grande orixá.
Disse-lhe que queria criar terra firme lá embaixo
E pediu-lhe que realizasse tal tarefa.
Para missão, deu-lhe uma concha marinha com terra,
Uma pomba e uma galinha com pés de cinco dedos.
Oxalá desceu ao pântano e depositou a terra da concha sobre a terra pôs
a pomba e a foram assim espalhando a terra que viera na concha
Até que terra firme se formou por toda parte.
Oxalá voltou a Olorum e relatou-se o sucedido.
Olorum enviou um camaleão para inspecionar a obra de Oxalá
E ele não pôde andar sobre o solo que ainda não era firme.
O camaleão voltou dizendo que a terra era ampla,
Mas ainda não suficientemente seca.
Numa segunda viagem o camaleão trouxe a notícia
De que a terra era ampla e suficientemente sólida,
Podendo-se agora viver em sua superfície.
O lugar mais tarde foi chamado de Ifé, que dizer ampla morada.
Depois Olorum mandou Oxalá de volta à terra
Para plantar árvores e dar alimentos e riquezas ao homem
E veio a chuva para regar as árvores.
Foi assim que tudo começou.
Foi ali, em Ifé, durante uma semana que quatro dias
Que Oxalá criou o mundo e tudo que existe nele.
Grupo Gorilas
Lenda do
tambor africano
~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~
Dizem na Guiné que a primeira viagem
à Lua foi feita pelo Macaquinho de nariz branco. Segundo dizem, certo dia, os
macaquinhos de nariz branco resolveram fazer uma viagem à Lua a fim de traze-la
para a Terra. Após tanto tentar subir, sem nenhum sucesso, um deles, dizem que
o menor, teve a idéia de subirem uns por cima dos outros, até que um deles
conseguiu chegar à Lua.
Porém, a pilha de macacos desmoronou
e todos caíram, menos o menor, que ficou pendurado na Lua. Esta lhe deu a mão e
o ajudou a subir. A Lua gostou tanto dele que lhe ofereceu, como regalo, um
tamborinho. O macaquinho foi ficando por lá, até que começou a sentir saudades
de casa e resolveu pedir à Lua que o deixasse voltar.
A Lua o amarrou ao tamborinho para
descê-lo pela corda, pedindo a ele que não tocasse antes de chegar à Terra e,
assim que chegasse, tocasse bem forte para que ela cortasse o fio.
O Macaquinho foi descendo feliz da
vida, mas na metade do caminho, não resistiu e tocou o tamborinho. Ao ouvir o
som do tambor a Lua pensou que o Macaquinho houvesse chegado à Terra e cortou a
corda. O Macaquinho caiu e, antes de morrer, ainda pode dizer a uma moça que o
encontrou, que aquilo que ele tinha era um tamborinho, que deveria ser entregue
aos homens do seu país. A moça foi logo contar a todos sobre o ocorrido.
Vieram pessoas de todo o país e,
naquela terra africana, ouviam-se os primeiros sons de tambor.
Gorilas
Ananse
~~~~~~~~
Ananse, ou Anansi, é uma lenda
africana. Conta um caso interessante, no qual no mundo antigo não havia
histórias e por isso viver aqui era muito triste.
Houve um tempo em que na Terra não
havia histórias para se contar, pois todas pertenciam a Nyame, o Deus do Céu.
Kwaku Ananse, o Homem Aranha, queria comprar as histórias de Nyame, o Deus do
Céu, para contar ao povo de sua aldeia, então por isso um dia, ele teceu uma
imensa teia de prata que ia do céu até o chão e por ela subiu.
Quando Nyame ouviu Ananse dizer que
queria comprar as suas histórias, ele riu muito e falou: - O preço de minhas
histórias, Ananse, é que você me traga Osebo, o leopardo de dentes terríveis;
Mmboro os marimbondos que picam como fogo e Moatia a fada que nenhum homem viu.
Ele pensava que com isso, faria
Ananse desistir da idéia, mas ele apenas respondeu: - Pagarei seu preço com
prazer, ainda lhe trago Ianysiá, minha velha mãe, sexta filha de minha avó.
Novamente o Deus do Céu riu muito e
falou: - Ora Ananse, como pode um velho fraco como você, tão pequeno, tão
pequeno, pagar o meu preço?
Mas Ananse nada respondeu, apenas
desceu por sua teia de prata que ia do Céu até o chão para pegar as coisas que
Deus exigia. Ele correu por toda a selva até que encontrou Osebo, leopardo de
dentes terríveis. - Aha, Ananse! Você chegou na hora certa para ser o meu
almoço. - O que tiver de ser será - disse Ananse - Mas primeiro vamos brincar
do jogo de amarrar? O leopardo que adorava jogos, logo se interessou: - Como se
joga este jogo? - Com cipós, eu amarro você pelo pé com o cipó, depois
desamarro, aí, é a sua vez de me amarrar. Ganha quem amarrar e desamarrar mais
depressa. - disse Ananse. - Muito bem, rosnou o leopardo que planejava devorar
o Homem Aranha assim que o amarrasse.
Ananse, então, amarrou Osebo pelo pé,
pelo pé e pelo pé, e quando ele estava bem preso, pendurou-o amarrado a uma
árvore dizendo: - Agora Osebo, você está pronto para encontrar Nyame o Deus do
Céu.
Aí, Ananse cortou uma folha de
bananeira, encheu uma cabaça com água e atravessou o mato alto até a casa de
Mmboro. Lá chegando, colocou a folha de bananeira sobre sua cabeça, derramou um
pouco de água sobre si, e o resto sobre a casa de Mmboro dizendo: - Está
chovendo, chovendo, chovendo, vocês não gostariam de entrar na minha cabaça
para que a chuva não estrague suas asas? - Muito obrigado, Muito obrigado!,
zumbiram os marimbondos entrando para dentro da cabaça que Ananse tampou
rapidamente.
O Homem Aranha, então, pendurou a
cabaça na árvore junto a Osebo dizendo: - Agora Mmboro, você está pronto para
encontrar Nyame, o Deus do Céu.
Depois, ele esculpiu uma boneca de
madeira, cobriu-a de cola da cabeça aos pés, e colocou-a aos pés de um flamboyant
onde as fadas costumam dançar. À sua frente, colocou uma tigela de inhame
assado, amarrou a ponta de um cipó em sua cabeça, e foi se esconder atrás de um
arbusto próximo, segurando a outra ponta do cipó e esperou. Minutos depois
chegou Moatia, a fada que nenhum homem viu. Ela veio dançando, dançando,
dançando, como só as fadas africanas sabem dançar, até aos pés do flamboyant.
Lá, ela avistou a boneca e a tigela de inhame. - Bebê de borracha. Estou com
tanta fome, poderia dar-me um pouco de seu inhame?
Ananse puxou a sua ponta do cipó para
que parecesse que a boneca dizia sim com a cabeça, a fada, então, comeu tudo,
depois agradeceu: - Muito obrigada bebê de borracha.
Mas a boneca nada respondeu, a fada,
então, ameaçou: - Bebê de borracha, se você não me responde, eu vou te bater.
E como a boneca continuasse parada,
deu-lhe um tapa ficando com sua mão presa na sua bochecha cheia de cola. Mais
irritada ainda, a fada ameaçou de novo: - Bebê de borracha, se você não me
responde, eu vou lhe dar outro tapa."
E como a boneca continuasse parada,
deu-lhe um tapa ficando agora, com as duas mãos presas. Mais irritada ainda, a
fada tentou livrar-se com os pés, mas eles também ficaram presos. Ananse então,
saiu de trás do arbusto, carregou a fada até a árvore onde estavam Osebo e
Mmboro dizendo: - Agora Mmoatia, você está pronta para encontrar Nyame o Deus
do Céu.
Aí, ele foi a casa de Ianysiá sua
velha mãe, sexta filha de sua avó e disse: - Ianysiá venha comigo vou dá-la a
Nyame em troca de suas histórias.
Depois, ele teceu uma imensa teia de
prata em volta do leopardo, dos marimbondos e da fada, e uma outra que ia do
chão até o Céu e por ela subiu carregando seus tesouros até os pés do trono de
Nyame. - Ave Nyame! - disse ele -Aqui está o preço que você pede por suas
histórias: Osebo, o leopardo de dentes terríveis, Mmboro, os marimbondos que
picam como fogo e Moatia a fada que nenhum homem viu. Ainda lhe trouxe Ianysiá
minha velha mãe, sexta filha de minha avó.
Ananse, maravilhado, desceu por sua
teia de prata levando consigo o baú das histórias até o povo de sua aldeia, e
quando ele abriu o baú, as histórias se espalharam pelos quatro cantos do mundo
vindo chegar até aqui.
·
Categoria: Mitos Lendas e Contos Africanos
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Num ano em que havia pouca comida, o
Cágado pegou no dinheiro que tinha economizado e foi a Nanhagaia onde comprou
um saco de milho.
Quando voltava para casa, viu, a certa altura, um tronco de árvore atravessado no caminho. Como não conseguia passar por cima dele, atirou o saco de milho para o outro lado e depois foi dar a volta.
Quando estava a dar a volta, ouviu uma voz a gritar:
— Viva, viva, tenho um saco de milho que caiu lá de cima.
Era o Lagarto, que segurava o saco que o Cágado tinha atirado.
O Cágado protestou:
— Não. O saco é meu. Comprei-o agora e vou levá-lo para casa.
O Lagarto não quis ouvir nada e levou o saco para casa dele, dizendo:
— Eu não o roubei a ninguém. Achei-o. Vou comer o milho porque encontrei o saco.
O Cágado ficou muito zangado mas não podia fazer nada. Cheio de fome, no dia seguinte foi com os filhos ver se encontrava alguma coisa para comer.
A certa altura, viram o rabo do Lagarto que tentava sair de dentro de um buraco. Só o rabo de fora. O Cágado agarrou no rabo e uma faca e preparou-se para o cortar. Depois de cortado, levou-o para casa e comeu-o com os filhos.
O Lagarto que, entretanto tinha conseguido sair do buraco, foi queixar-se ao responsável da aldeia:
— O Cágado cortou-me o rabo. Mande-o chamar para ele dizer porque é que me cortou o rabo.
O responsável convocou o Cágado e perguntou-lhe:
— É verdade que tu cortaste o rabo ao Lagarto?
O Cágado, que era muito esperto, disse:
— É verdade que eu encontrei um rabo perto de um buraco e o levei para casa para comer, mas não era de ninguém. Eu não vi mais nada senão o rabo.
— Mas o rabo era meu — gritou o Lagarto — tens de o pagar.
O Cágado respondeu:
— Não, não pago. Eu fiz o mesmo que tu fizeste ontem. Tu ontem encontraste o meu saco de milho e comeste-o. Eu hoje encontrei o teu rabo e comi-o. Agora estamos pagos.
O responsável achou que ele tinha razão e mandou-os embora.
Nota: Aquele que aprende, ensina.
Quando voltava para casa, viu, a certa altura, um tronco de árvore atravessado no caminho. Como não conseguia passar por cima dele, atirou o saco de milho para o outro lado e depois foi dar a volta.
Quando estava a dar a volta, ouviu uma voz a gritar:
— Viva, viva, tenho um saco de milho que caiu lá de cima.
Era o Lagarto, que segurava o saco que o Cágado tinha atirado.
O Cágado protestou:
— Não. O saco é meu. Comprei-o agora e vou levá-lo para casa.
O Lagarto não quis ouvir nada e levou o saco para casa dele, dizendo:
— Eu não o roubei a ninguém. Achei-o. Vou comer o milho porque encontrei o saco.
O Cágado ficou muito zangado mas não podia fazer nada. Cheio de fome, no dia seguinte foi com os filhos ver se encontrava alguma coisa para comer.
A certa altura, viram o rabo do Lagarto que tentava sair de dentro de um buraco. Só o rabo de fora. O Cágado agarrou no rabo e uma faca e preparou-se para o cortar. Depois de cortado, levou-o para casa e comeu-o com os filhos.
O Lagarto que, entretanto tinha conseguido sair do buraco, foi queixar-se ao responsável da aldeia:
— O Cágado cortou-me o rabo. Mande-o chamar para ele dizer porque é que me cortou o rabo.
O responsável convocou o Cágado e perguntou-lhe:
— É verdade que tu cortaste o rabo ao Lagarto?
O Cágado, que era muito esperto, disse:
— É verdade que eu encontrei um rabo perto de um buraco e o levei para casa para comer, mas não era de ninguém. Eu não vi mais nada senão o rabo.
— Mas o rabo era meu — gritou o Lagarto — tens de o pagar.
O Cágado respondeu:
— Não, não pago. Eu fiz o mesmo que tu fizeste ontem. Tu ontem encontraste o meu saco de milho e comeste-o. Eu hoje encontrei o teu rabo e comi-o. Agora estamos pagos.
O responsável achou que ele tinha razão e mandou-os embora.
Nota: Aquele que aprende, ensina.
NOME: Beatriz Fonseca Rocha \ GRUPO : Afrodescendentes .
Uma gazela encontrou um caracol e
disse-lhe:
— Tu, caracol, és incapaz de correr, só te arrastas pelo chão.
O caracol respondeu:
— Vem cá no Domingo e verás!
O caracol arranjou cem papéis e em cada folha escreveu: «Quando vier a gazela e disser "caracol", tu respondes com estas palavras: "Eu sou o caracol"». Dividiu os papéis pelos seus amigos caracóis dizendo-lhes:
— Leiam estes papéis para que saibam o que fazer quando a gazela vier.
No Domingo a gazela chegou à povoação e encontrou o caracol. Entretanto, este pedira aos seus amigos que se escondessem em todos os caminhos por onde ela passasse, e eles assim fizeram.
Quando a gazela chegou, disse:
— Vamos correr, tu e eu, e tu vais ficar para trás!
O caracol meteu-se num arbusto, deixando a gazela correr.
Enquanto esta corria ia chamando:
— Caracol!
E havia sempre um caracol que respondia:
— Eu sou o caracol.
Mas nunca era o mesmo por causa das folhas de papel que foram distribuídas.
A gazela, por fim, acabou por se deitar, esgotada, morrendo com falta de ar. O caracol venceu, devido à esperteza de ter escrito cem papéis.
— Tu, caracol, és incapaz de correr, só te arrastas pelo chão.
O caracol respondeu:
— Vem cá no Domingo e verás!
O caracol arranjou cem papéis e em cada folha escreveu: «Quando vier a gazela e disser "caracol", tu respondes com estas palavras: "Eu sou o caracol"». Dividiu os papéis pelos seus amigos caracóis dizendo-lhes:
— Leiam estes papéis para que saibam o que fazer quando a gazela vier.
No Domingo a gazela chegou à povoação e encontrou o caracol. Entretanto, este pedira aos seus amigos que se escondessem em todos os caminhos por onde ela passasse, e eles assim fizeram.
Quando a gazela chegou, disse:
— Vamos correr, tu e eu, e tu vais ficar para trás!
O caracol meteu-se num arbusto, deixando a gazela correr.
Enquanto esta corria ia chamando:
— Caracol!
E havia sempre um caracol que respondia:
— Eu sou o caracol.
Mas nunca era o mesmo por causa das folhas de papel que foram distribuídas.
A gazela, por fim, acabou por se deitar, esgotada, morrendo com falta de ar. O caracol venceu, devido à esperteza de ter escrito cem papéis.
NOME: Beatriz Fonseca Rocha \ GRUPO: afrodescendentes \ link :
http://www.cabinda.com.br/index.php/mitos-lendas-e-contos-africanos/94-a-gazela,-o-caracol-e-a-esperteza.html
O Gato e o Rato tornaram-se amigos. Um dia combinaram fazer uma viagem a
uma terra distante. Pelo caminho tinham de atravessar um rio.
— Por onde passaremos? —
perguntou o Gato. — O rio leva muita água.
O Rato respondeu:
— Não faz mal. Fazemos um barco.
O Gato concordou e logo ali os
dois colheram uma grande raiz de mandioca e fizeram um barco com ela. Meteram o
barco na água, entraram para ele e começaram a atravessar o rio.
Pelo caminho começaram a ter
fome e repararam que não tinham levado comida.
O Gato perguntou então:
— O que é que nós havemos de
comer?
— Não te preocupes, amigo Gato,
porque podemos comer o nosso próprio barco.
E os dois começaram a comer o
barco. O Gato pouco comeu porque a mandioca não lhe sabia bem, mas o Rato
comeu, comeu, comeu até que acabou por furar o barco, que foi ao fundo.
O Gato e o Rato tiveram que
nadar até à margem, mas, enquanto o Rato nadava bem e depressa, o Gato que mal
sabia nadar, só com muita dificuldade e muito envergonhado é que conseguiu
chegar a terra.
— Sinto muita fome, Rato. Vou
ter de te comer.
— Está bem — disse o Rato
espertalhão — mas olha que eu estou muito sujo. É melhor ir primeiro lavar-me.
Espera aí . O Rato
afastou-se e desapareceu. O Gato ainda hoje está à espera.
POSTAGEM : GRUPO :
afrodescendentes .
http://www.cabinda.com.br/index.php/mitos-lendas-e-contos-africanos/107-o-gato-e-o-rato.html
O Corvo era muito amigo do Coelho. Combinaram, um
dia, que cada um deles transportasse o companheiro às costas, indo de povoação
em povoação, para dar a conhecer às pessoas a amizade que os unia.
O Corvo começou a carregar o Coelho. Andou com ele às costas pelas aldeias e a gente, quando o via, perguntava-lhe:
— Ó Corvo, que trazes tu aí?
— Trago um amigo meu que acaba de chegar de Namandicha.
Passou assim com ele por muitas terras.
Chegou depois a vez de ser o Coelho a carregar com o Corvo. Ao passar por uma aldeia, os moradores perguntaram-lhe:
— Ó Coelho, que trazes tu às costas?
— Ora, ora, trago penas, penugem e um grande bico. Respondeu, a troçar, o Coelho.
O Corvo não gostou que o companheiro o gozasse daquela maneira, saltou logo para o chão e deixaram de ser amigos.
Nota: Um inimigo inteligente é melhor que um amigo estúpido. Este é o modo sutil de dizer daquele que fez ações indignas, e perde a confiança e a amizade dos outros. Pois de um inimigo se prevê atitudes e nada se espera e, em amigo, deve-se confiar.
O Corvo começou a carregar o Coelho. Andou com ele às costas pelas aldeias e a gente, quando o via, perguntava-lhe:
— Ó Corvo, que trazes tu aí?
— Trago um amigo meu que acaba de chegar de Namandicha.
Passou assim com ele por muitas terras.
Chegou depois a vez de ser o Coelho a carregar com o Corvo. Ao passar por uma aldeia, os moradores perguntaram-lhe:
— Ó Coelho, que trazes tu às costas?
— Ora, ora, trago penas, penugem e um grande bico. Respondeu, a troçar, o Coelho.
O Corvo não gostou que o companheiro o gozasse daquela maneira, saltou logo para o chão e deixaram de ser amigos.
Nota: Um inimigo inteligente é melhor que um amigo estúpido. Este é o modo sutil de dizer daquele que fez ações indignas, e perde a confiança e a amizade dos outros. Pois de um inimigo se prevê atitudes e nada se espera e, em amigo, deve-se confiar.
postagem: Beatriz Fonseca Rocha \
GRUPO: afrodescendentes .
http://www.cabinda.com.br/index.php/mitos-lendas-e-contos-africanos/104-o-corvo,-o-coelho-e-a-amizade.html
O sapo e a cobra (
lenda africana )
Um dia, um sapinho se
deparou com um bicho deitado no caminho. Ele era todo colorido e brilhante,
fino e comprido. O sapo o cumprimentou e perguntou o que fazia ali. O animal
respondeu que estava esquentando-se ao sol, e que era uma cobrinha, e o que era
ele? O pequeno respondeu que era um sapo e convidou a cobra para brincar.
Brincaram a manhã toda! O sapo ensinou a cobra dar saltos. A cobra ensinou o
sapo a subir nas árvores e deslizar pelos troncos.
Como ficaram com fome, cada um foi para sua casa, prometendo se encontrar no dia seguinte. Em casa, o sapinho mostrou à mãe que aprendera a rastejar com a cobra. A mamãe sapa chamou sua atenção, dizendo que as cobras não eram criaturas boas e proibiu o filhinho de brincar com elas e de rastejar. Na casa da cobra aconteceu a mesma coisa. Vendo a filha pular e, sabendo que ela havia aprendido com o sapo, alertou-a dizendo que cobras não se davam bem com sapos, e muito menos pulavam; quando encontrasse o sapinho de novo, deveria agarrá-lo e comê-lo. No outro dia, cada um dos animaizinhos ficou num canto. O sapo disse à cobra que não ia poder rastejar com ela e, a cobra, pensava que, se o sapo se aproximasse ia devorá-lo. Mas, lembrando-se do dia feliz que tiveram na véspera e dos pulos que aprendeu a dar com o sapinho, apenas suspirou e foi embora. Desde esse dia, nunca mais o sapinho e a cobrinha brincaram juntos, ficavam somente ao sol, lembrando que num único dia foram amigos.”
Será que o mundo não seria muito melhor se despíssemos dos nossos preconceitos e déssemos uma chance para o outro se mostrar como verdadeiramente é?
Como ficaram com fome, cada um foi para sua casa, prometendo se encontrar no dia seguinte. Em casa, o sapinho mostrou à mãe que aprendera a rastejar com a cobra. A mamãe sapa chamou sua atenção, dizendo que as cobras não eram criaturas boas e proibiu o filhinho de brincar com elas e de rastejar. Na casa da cobra aconteceu a mesma coisa. Vendo a filha pular e, sabendo que ela havia aprendido com o sapo, alertou-a dizendo que cobras não se davam bem com sapos, e muito menos pulavam; quando encontrasse o sapinho de novo, deveria agarrá-lo e comê-lo. No outro dia, cada um dos animaizinhos ficou num canto. O sapo disse à cobra que não ia poder rastejar com ela e, a cobra, pensava que, se o sapo se aproximasse ia devorá-lo. Mas, lembrando-se do dia feliz que tiveram na véspera e dos pulos que aprendeu a dar com o sapinho, apenas suspirou e foi embora. Desde esse dia, nunca mais o sapinho e a cobrinha brincaram juntos, ficavam somente ao sol, lembrando que num único dia foram amigos.”
Será que o mundo não seria muito melhor se despíssemos dos nossos preconceitos e déssemos uma chance para o outro se mostrar como verdadeiramente é?
POSTAGEM : Beatriz
Fonseca Rocha / GRUPO: afrodescendentes
link: http://www.osabetudo.com/o-sapo-e-a-cobra-lenda-africana/
NOZ-DE-COLA
Em toda a África Ocidental, os
jovens, os velhos, os homens, as mulheres, todo mundo gosta de lambiscar
noz-de-cola, uma frutinha muito conhecida por lá. Os velhos, especialmente, têm
sempre uma, duas ou três no fundo do bolso…
De manhã, a gente sabe o que tem
de saber de manhã. De noite, a gente sabe o que tem de saber de noite. Quem
cultiva a terra conhece a paciência.
Naquele dia, Noz-de-Cola
cultivava o pedaço de terra que ele havia limpado. Preparava o solo para
plantar inhame, afogando com sua daba. Não muito longe dali, havia uns gênios
dos campos. Mal ouviram o barulho da daba revolvendo o solo, perguntaram:
- Quem está trabalhando este
roçado?
Noz-de-cola respondeu:
- Sou eu! Desmatei, limpei e
agora estou preparando a terra para plantar inhame.
Os gênios chamaram imediatamente
seus filhos e foram ajudar Noz-de-Cola. Antes tinha terminado. Era meio-dia em
ponto quando Noz-de-Cola, feliz da vida, voltou para a aldeia.
Depois, quando Noz-de-Cola foi
plantar seu inhame, a mesma coisa aconteceu: os gênios dos campos e seus filhos
vieram acudi-lo.
Depois, quando Noz-de-Cola votou
à sua roça para capinar em torno dos pés de inhame, os gênios, que continuavam
por lá, perguntaram:
- Quem está trabalhando este roçado?
- Sou eu, Noz-de-Cola, capinando em
torno dos meus pés de inhame.
No mesmo instante, os gênios vieram
ajudar Noz-de-Cola e capinaram rapidinho em torno dos inhames.
Agora Noz-de-Cola podia esperar o
tempo passar até que chegasse a hora de colher seus inhames. Por isso, ele
viajou ao sul e ao leste para visitar o povo da água e o povo da floresta,
deixando a roça aos cuidados da sua mulher.
Um dia, quando ela vigiava a roça
como filhinho nas costas e apanhava lenha, o menino começou a chorar. Para
acalmá-lo, ela quis catar um pequeno inhame, um inhame miudinho que ainda não
tinha tido tempo de crescer.
Quando desenterrava esse pequeno
inhame para dar ao neném, os gênios dos campos perguntaram:
- Quem está cavando aí?
Ela respondeu:
- Sou eu, a mulher de
Noz-de-Cola. Estou desenterrando um inhamezinho para acalmar meu bebê.
No mesmo instante, os
gênios e seus filhos vieram ajudar a mulher de Noz-de-Cola e logo tiraram do
chão todos os inhames miúdos, amontoando-os na beira do campo.
A mulher de Noz-de-Cola, ao
ver aquele desastre, pôs-se a chorar. E ainda chorava quando Noz-de-Cola voltou
da viagem. Ele perguntou:
- Está chorando por quê?
Ela explicou. Fulo da vida, ele lhe deu uma
bofetada. Os gênios dos campos, que continuavam por lá, ouviram o barulho da
bofetada e perguntaram:
- Quem está batendo assim?
- Sou eu, Noz-de-Cola, esbofeteando minha
mulher.
No mesmo instante, os gênios e
seus filhos vieram ajudar Noz-de-Cola. Eles bateram tanto, que mataram a
mulher.
Noz-de-Cola nem precisou interrogar o cadáver
para entender de que ela tinha morrido! Desatou a chorar. Foi então que um
mosquito veio picá-lo no braço. Para defender-se, ele deu um tapa com toda a
força no lugar da picada, mas sem acertar o inseto. Os gênios dos campos,
que continuavam pó lá, perguntaram:
- Quem está batendo assim?
- Sou eu, Noz-de-Cola, tentando
matar um mosquito que veio me picar.
No mesmo instante, os
gênios e seus filhos vieram ajudar Noz-de-Cola, desferindo-lhe uma saraivada de
tapas.
Ainda bem que Noz-de-Cola
era rápido na corrida. Conseguiu chegar à aldeia em disparada e refugiar-se no
bolso de um velho. É por isso que, desde então, sempre tem uma noz-de-cola no
bolso dos velhos.
http://geocaieiras.wordpress.com/2012/06/18/lendas-africanas/
POSTAGEM: BEATRIZ FONSECA / GRUPO:
afrodescendentes
Todos dependem da boca
Certo dia, a boca, com ar vaidoso, perguntou:- Embora o corpo seja um só, qual é o órgão mais importante?
Os
olhos responderam:
- O órgão mais importante somos nós: observamos o que se passa e vemos as coisas.
- Somos nós, porque ouvimos – disseram os ouvidos.
- Estão enganados. Nós é que somos mais importantes porque agarramos as coisas, disseram as mãos.
Mas o coração também tomou a palavra:
- Então e eu? Eu é que sou importante: faço funcionar todo o corpo!
- E eu trago em mim os alimentos – interveio a barriga.
- Olha! Importante é aguentar todo o corpo como nós, as pernas, fazemos.
Estavam nisto, quando a mulher trouxe a massa, chamando-os para comer. Então os olhos viram a massa, o coração emocionou-se, a barriga esperou ficar farta, os ouvidos escutavam, as mãos podiam tirar bocados, as pernas andaram... mas a boca recusou comer. E continuou a recusar.
Por isso, todos os outros órgãos começaram a ficar sem forças...
Então a boca voltou a perguntar:
- Afinal qual é o órgão mais importante no corpo?
- És tu boca, responderam todos em coro. Tu é o nosso rei!
- O órgão mais importante somos nós: observamos o que se passa e vemos as coisas.
- Somos nós, porque ouvimos – disseram os ouvidos.
- Estão enganados. Nós é que somos mais importantes porque agarramos as coisas, disseram as mãos.
Mas o coração também tomou a palavra:
- Então e eu? Eu é que sou importante: faço funcionar todo o corpo!
- E eu trago em mim os alimentos – interveio a barriga.
- Olha! Importante é aguentar todo o corpo como nós, as pernas, fazemos.
Estavam nisto, quando a mulher trouxe a massa, chamando-os para comer. Então os olhos viram a massa, o coração emocionou-se, a barriga esperou ficar farta, os ouvidos escutavam, as mãos podiam tirar bocados, as pernas andaram... mas a boca recusou comer. E continuou a recusar.
Por isso, todos os outros órgãos começaram a ficar sem forças...
Então a boca voltou a perguntar:
- Afinal qual é o órgão mais importante no corpo?
- És tu boca, responderam todos em coro. Tu é o nosso rei!
Grupo:Khalil
http://lendasafricanas33c.blogspot.com.br/
O SAHULI
Era uma vez um homem que se chamava Sahúli. Era
cego e tinha dois filhos que se dedicavam à caça e andavam com uma espingarda.
Um dia, os filhos foram caçar para a região deserta e levaram o pai, para que guardasse a carne. Quando chegaram, montaram o acampamento e partiram para a caça.
O pai ficou sozinho e começou a ouvir atrás de si: nji!nji! Eram passos de uma pessoa. E Sahúli disse:
- Sê bem vindo, amigo!
O que tinha chegado, respondeu:
- Obrigado, amigo! E perguntou a Sahúli:
- Ó amigo! De que é que sofres? Estás cego dos olhos ou do coração?
Sahúli respondeu: - Os olhos estão cegos! O coração, cá dentro, está são!
O outro voltou-se: - Então diz: "Claridade"!
Quando Sahúli disse claridade, os seus olhos abriram-se e viu o homem sentado à sua beira. Sahúli preparou um pouco de tabaco, acendeu-o e deu-o ao amigo. Depois, os dois começaram a arrumar o acampamento: foram à lenha, foram à água, varreram, fizeram comida. E tudo ficou em ordem. Por fim, aquele que tinha vindo, disse: - Ó amigo! Estás cego dos olhos ou do coração?
Sahúli respondeu: - Estou cego dos olhos. Então, diz "Escuridão"! Disse o amigo. E Sahúli disse escuridão e deixou logo de ver. Quando os filhos chegaram ao acampamento ficaram muito admirados e perguntaram: - Quem arrumou tudo isto? Sahúli contou-lhe o que se tinha passado, que tinha recuperado a vista por instantes. Os filhos disseram-lhe então: - Se esse amigo voltar, quando ele te pedir para dizeres escuridão, tu não dizes e em vez disso, vais dizer claridade. E vamos ver o que acontece! Fez-se noite e eles deitaram-se. E de manhã lá foram para a floresta caçar. O pai, mais uma vez, ficou no acampamento até que voltou a ouvir: nji!nji! Sahúli disse-lhe: - Sê bem vindo, amigo. O outro responde-lhe: - Obrigado amigo! E perguntou-lhe: - Ó amigo! De que sofres? Dos olhos ou do coração? Sahúli disse: - Estou cego dos olhos! E o amigo pede-lhe para ele dizer " Claridade".
Sahúli, mais uma vez, disse a palavra e os seus olhos abriram-se. Sahúli preparou novamente um pouco de tabaco, acendeu-o e ofereceu-lho. Depois de o terem fumado, começaram a fazer o trabalho deles.
Sahúli não se tinha esquecido do conselho dos filhos. Tirou comida e ofereceu-a ao amigo. E tudo correu bem até ao fim. Até que o outro se preparava para ir embora e perguntou a Sahúli:
- Ó Sahúli! Estás cego dos olhos ou do coração?! Ele respondeu dizendo:
- Os olhos estão cegos! O coração está são! E o outro:
- Ora diz "Escuridão"! Mas, Sahúli, lembrando-se do que os seus filhos lhe tinham dito, respondeu:
- "Claridade". E eis que ele continuou a ver! O amigo pegou numa mezinha que trazia consigo, aplicou-a nos olhos do Sahúli e eles ficarão sãos.
Despediram-se, fizeram cargas de carne para o outro e ele partiu. Quando os filhos voltaram, ficaram muito alegres por verem que o pai tinha recuperado a vista. Deixaram o acampamento e foram para a aldeia, onde os receberam com muitas palmas.
Um dia, os filhos foram caçar para a região deserta e levaram o pai, para que guardasse a carne. Quando chegaram, montaram o acampamento e partiram para a caça.
O pai ficou sozinho e começou a ouvir atrás de si: nji!nji! Eram passos de uma pessoa. E Sahúli disse:
- Sê bem vindo, amigo!
O que tinha chegado, respondeu:
- Obrigado, amigo! E perguntou a Sahúli:
- Ó amigo! De que é que sofres? Estás cego dos olhos ou do coração?
Sahúli respondeu: - Os olhos estão cegos! O coração, cá dentro, está são!
O outro voltou-se: - Então diz: "Claridade"!
Quando Sahúli disse claridade, os seus olhos abriram-se e viu o homem sentado à sua beira. Sahúli preparou um pouco de tabaco, acendeu-o e deu-o ao amigo. Depois, os dois começaram a arrumar o acampamento: foram à lenha, foram à água, varreram, fizeram comida. E tudo ficou em ordem. Por fim, aquele que tinha vindo, disse: - Ó amigo! Estás cego dos olhos ou do coração?
Sahúli respondeu: - Estou cego dos olhos. Então, diz "Escuridão"! Disse o amigo. E Sahúli disse escuridão e deixou logo de ver. Quando os filhos chegaram ao acampamento ficaram muito admirados e perguntaram: - Quem arrumou tudo isto? Sahúli contou-lhe o que se tinha passado, que tinha recuperado a vista por instantes. Os filhos disseram-lhe então: - Se esse amigo voltar, quando ele te pedir para dizeres escuridão, tu não dizes e em vez disso, vais dizer claridade. E vamos ver o que acontece! Fez-se noite e eles deitaram-se. E de manhã lá foram para a floresta caçar. O pai, mais uma vez, ficou no acampamento até que voltou a ouvir: nji!nji! Sahúli disse-lhe: - Sê bem vindo, amigo. O outro responde-lhe: - Obrigado amigo! E perguntou-lhe: - Ó amigo! De que sofres? Dos olhos ou do coração? Sahúli disse: - Estou cego dos olhos! E o amigo pede-lhe para ele dizer " Claridade".
Sahúli, mais uma vez, disse a palavra e os seus olhos abriram-se. Sahúli preparou novamente um pouco de tabaco, acendeu-o e ofereceu-lho. Depois de o terem fumado, começaram a fazer o trabalho deles.
Sahúli não se tinha esquecido do conselho dos filhos. Tirou comida e ofereceu-a ao amigo. E tudo correu bem até ao fim. Até que o outro se preparava para ir embora e perguntou a Sahúli:
- Ó Sahúli! Estás cego dos olhos ou do coração?! Ele respondeu dizendo:
- Os olhos estão cegos! O coração está são! E o outro:
- Ora diz "Escuridão"! Mas, Sahúli, lembrando-se do que os seus filhos lhe tinham dito, respondeu:
- "Claridade". E eis que ele continuou a ver! O amigo pegou numa mezinha que trazia consigo, aplicou-a nos olhos do Sahúli e eles ficarão sãos.
Despediram-se, fizeram cargas de carne para o outro e ele partiu. Quando os filhos voltaram, ficaram muito alegres por verem que o pai tinha recuperado a vista. Deixaram o acampamento e foram para a aldeia, onde os receberam com muitas palmas.
grupo:Gorilas Fonte: Odisseia 2000
PARA TI
[Mia Couto]
Foi para ti
que desfolhei a chuva
para ti soltei o perfume da terra
toquei no nada
e para ti foi tudo
Para ti criei todas as palavras
e todas me faltaram
no minuto em que falhei
o sabor do sempre
Para ti dei voz
às minhas mãos
abri os gomos do tempo
assaltei o mundo
e pensei que tudo estava em nós
nesse doce engano
de tudo sermos donos
sem nada termos
simplesmente porque era de noite
e não dormíamos
eu descia em teu peito
para me procurar
e antes que a escuridão
nos cingisse a cintura
ficávamos nos olhos
vivendo de um só olhar
amando de uma só vida.
Grupo:khallil
http://culturadetravesseiro.blogspot.com.br/
A menina sem palavras,Mia
couto
Resultados
da pes
Os dezessete contos desta antologia foram escritos
em fases distintas da carreira do escritor Mia Couto e compõem um panorama
surpreendente do universo infantil em Moçambique. Acostumados a reconhecer nos
povos africanos a violência e a miséria, o leitor encontrará nessa seleção uma
delicadeza que não se vê nos relatos oficiais. As histórias selecionadas
mostram a complexidade que move as relações familiares, a orfandade em um país
que viveu por anos em guerra, a realidade das crianças submetidas ao trabalho
infantil e os resquícios da luta pela independência.
Mia Couto é um prosador bastante sensível às complexidades da vida e um escritor que constrói as narrativas inspiradas na linguagem oral, revelando a sua influência e admiração pelo nosso Guimarães Rosa, sem contar a presença do fantástico e do religioso em suas histórias.
Mia Couto é um prosador bastante sensível às complexidades da vida e um escritor que constrói as narrativas inspiradas na linguagem oral, revelando a sua influência e admiração pelo nosso Guimarães Rosa, sem contar a presença do fantástico e do religioso em suas histórias.
grupo:príncipe
Lenda da Girafa
Há muito, muito tempo, a girafa era um animal igual
aos outros, com um pescoço de tamanho normal.
Houve então uma terrível seca. Os animais comeram
toda a erva que havia até mesmo as ervas secas e duras, e andavam quilômetros
para ter água para beber.
Um dia, a Girafa encontrou o seu amigo Rinoceronte.
Estava muito calor e ambos percorriam lentamente o caminho que levava ao
bebedouro mais próximo e lamentavam-se.
- Ah, meu amigo – disse a Girafa, – vê só… Tantos
animais a escavar o chão à procura de comida… Está tudo seco, mas as acácias
mantêm-se verdes.
- Hum, hum – disse o Rinoceronte (que não era – e
ainda não é – muito falador).
- Seria tão bom – disse a Girafa – poder
chegar aos ramos mais altos, às folhas tenras. Há muita comida, mas não
conseguimos lá chegar porque não conseguimos subir às árvores.
O Rinoceronte olhou para cima e concordou, abanando
a cabeça:
- Talvez devêssemos ir falar como o Feiticeiro. Ele
é sábio e poderoso.
- Que bela ideia! – disse a Girafa. – Sabes onde
fica a casa do Feiticeiro?
O Rinoceronte acenou afirmativamente e os dois
amigos dirigiram-se para a casa do Feiticeiro após matarem a sede.
Depois de uma caminhada longa e cansativa, os dois
chegaram à casa do Feiticeiro e explicaram-lhe ao que vinham.
Depois de ouvi-los, o Feiticeiro deu uma gargalhada
e disse:
- Isso é muito fácil. Voltem amanhã ao meio-dia e
eu dar-vos-ei uma erva mágica. Ela fará com que os vossos pescoços e as vossas
pernas cresçam. Assim, poderão comer as folhas tenras das acácias.
No dia seguinte, só a Girafa chegou à cabana na
hora marcada.
O Rinoceronte, que não era lá muito esperto,
encontrou um tufo de erva ainda verde e ficou tão contente que se esqueceu do
compromisso. Cansado de esperar pelo Rinoceronte, o Feiticeiro deu a erva
mágica à Girafa e desapareceu.
A Girafa comeu sozinha uma dose preparada para
dois. Sentiu imediatamente uma sensação estranha nas suas pernas e pescoço e
viu que o chão estava a afastar-se rapidamente.
“Que engraçado!” pensou a Girafa, fechando os
olhos, pois começava a sentir-se tonta.
Passado algum tempo abriu lentamente os olhos. Como
o mundo tinha mudado!
As nuvens estavam mais perto e ela conseguia ver
longe, muito longe. A Girafa olhou para as suas longas pernas, moveu o seu
pescoço longo e gracioso e sorriu. À sua frente estava uma acácia bem verdinha…
A Girafa deu dois passos e comeu as suas primeiras
folhas.
Após terminar a sua refeição, o Rinoceronte
lembrou-se do compromisso e correu o mais depressa que pôde para a casa do
Feiticeiro.
Tarde demais! Quando lá chegou já a Girafa comia,
regalada, as folhas da acácia.
Quando o feiticeiro lhe disse que já não havia mais
ervas mágicas, o Rinoceronte ficou furioso, pois pensou que tinha sido enganado
e não que fora o seu enorme atraso que o tinha prejudicado.
Tão furioso ficou que perseguiu o Feiticeiro pela
savana fora.
Diz-se que foi a partir desse dia que o
Rinoceronte, zangado com as pessoas, as persegue sempre que vê uma perto de si.
FONTE: http://geocaieiras.wordpress.com/2012/06/18/lendas-africanas/
GRUPO: AFRO-DECENDENTES
A Serpente de Olumo
Um jovem, chamado Ayobami, vivia feliz
na sua aldeia até ao momento em que, tendo atingido a idade adequada, decidiu,
com o consentimento dos pais, arranjar mulher e casar.
Ayobami tinha duas amigas que já conhecia há muito tempo e com as quais passara toda a sua infância: a mais nova chamava-se Olu, a outra Yemesi. Ayobami queria absolutamente casar-se com uma das duas, mas não sabia qual delas escolher. Eram muito diferentes uma da outra, mas igualmente belas.
Pelo seu lado, as duas jovens amavam Ayobami. O homem era bom trabalhador e excelente caçador; possuía o sentido da justiça, sendo respeitado em toda a aldeia e bastante conhecido nos arredores. Ayobami era rico e bem constituído, teria podido muito bem casar com as duas raparigas ao mesmo tempo; mas a tradição não o permitia. Não conseguindo decidir-se, viam-no ficar longas horas sentado diante da sua cabana, a examinar as vantagens que teria em se casar com uma ou com outra. Quando julgava ter decidido e se levantava para ir anúnciar a boa nova a seus pais, pensava imediatamente nas qualidades da outra e voltava a hesitar.
As duas jovens, por seu lado, rivalizavam em gentileza e em beleza, não estando nenhuma delas disposta a ceder o seu lugar à outra. A última palavra cabia, pois, a Ayobami. Precisava de saber, a todo o custo, qual das raparigas o amava mais.
Uma tarde, enquanto as duas raparigas estavam sentadas ao pé de Ayobami, estando este a refletir nesse problema, uma serpente transparente saíu da floresta de Olumo, uma das colinas da região de Abeokuta. Tinha à cabeça três enfeites, e todo o seu corpo, extremamente comprido, fumegava ligeiramente ao deslizar em silêncio por entre as ervas. Quando chegou perto da fogueira, ergueu-se sobre a cauda e dançou por instantes, enquanto as chamas brilhavam nos seus olhos vermelhos. Todos estes sinais lhe davam uma aparência mágica, e toda a gente reconheceu assim nela uma serpente enfeitiçada e sagrada.
Ayobami, que estava de costas para a serpente, não a viu chegar, e quando as duas raparigas finalmente a avistaram, já era demasido tarde. Gritaram ao mesmo tempo quando a serpente mordeu Ayobami na coxa, antes de desaparecer na noite. Ela cumprira assim a missão que os deuses lhe tinham confiado.
Em breve, Ayobami foi obrigado a ir-se deitar no interior da sua cabana. As duas jovens
despertaram então toda a aldeia. Foram
procurar o curandeiro que, reconhecendo nisso um sinal dos deuses, não quis
intervir.
As velhas mandaram, então, ferver
imediatamente umas ervas e uns pós, que puseram na ferida, mas sem sucesso.
Tudo foi tentado para salvar a vida de Ayobami; contudo, umas horas depois,
este acabou por morrer, sem sequer ter voltado a abrir os olhos e, sobretudo,
sem ter chegado a dizer qual das duas jovens preferia.
Ambas se puseram então a chorar a morte do seu amigo. De manhã, Olu, a mais nova, levantou-se e proferiu as seguintes palavras:
-Sem a existência de Ayobami, a minha vida já não tem sentido. Quando o fogo morre, o fumo desaparece com ele. Não posso viver sem a sua presença. Assim, vou hoje juntar-me a ele na morte.
E, antes que alguém a tivesse podido impedir, pôs-se a correr através do mato. Encontrou a pista da serpente enfeitiçada, foi ter com ela e, por seu turno, fez com que ela a mordesse. Olu tombou por terra, caindo entre as ervas, e morreu pouco depois, julgando estar aí todo o preço do seu amor.
Yemesi não sabia o que fazer. Refletiu alguns instantes e, depois, de súbito, decidiu-se. Entrou na cabana de seu pai, pegou na grande catana pendurada numa das paredes, e seguiu igualmente a pista da serpente. Quando a apanhou, e no momento em que erguia a arma para lhe cortar a cabeça, a serpente ergueu-se à sua frente e disse-lhe:
-Yemesi, não me mates! Se me deixares viver, ajudarte-ei a salvar Ayobami.
A jovem aceitou e a serpente deu-lhe, então, dois saquinhos, um contendo um pó negro e outro um pó branco.
-Pega nestes dois sacos e pôe-te em cima do cadáver de Ayobami. Fecha os olhos e lança o pó negro para muito longe, na direção do sol nascente, e o pó branco também para muito longe, na direção do sol poente.
Yemesi seguiu os conselhos da serpente e, de imediato, Ayobami e Olu foram misteriosamente ressuscitados.
Ayobami não hesitou mais e escolheu aquela que devia ser a sua esposa para toda a vida.
Caro leitor se fosses Ayobami, qual das duas jovens terias escolhido: aquela que lhe provou o seu amor morrendo com ele, ou aquela que lhe voltou a dar a vida.
GRUPO : Pangolin
FONTE:http://www.ciadejovensgriots.org.br
"TAMBOR AFRICANO"
Dizem na Guiné que a primeira viagem
à Lua foi feita pelo Macaquinho de nariz branco. Segundo dizem, certo dia, os
macaquinhos de nariz branco resolveram fazer uma viagem à Lua a fim de traze-la
para a Terra. Após tanto tentar subir, sem nenhum sucesso, um deles, dizem que
o menor, teve a idéia de subirem uns por cima dos outros, até que um deles
conseguiu chegar à Lua.
Porém, a pilha de macacos desmoronou
e todos caíram, menos o menor, que ficou pendurado na Lua. Esta lhe deu a mão e
o ajudou a subir. A Lua gostou tanto dele que lhe ofereceu, como regalo, um
tamborinho. O macaquinho foi ficando por lá, até que começou a sentir saudades
de casa e resolveu pedir à Lua que o deixasse voltar.
A Lua o amarrou ao tamborinho para
descê-lo pela corda, pedindo a ele que não tocasse antes de chegar à Terra e,
assim que chegasse, tocasse bem forte para que ela cortasse o fio.
O Macaquinho foi descendo feliz da
vida, mas na metade do caminho, não resistiu e tocou o tamborinho. Ao ouvir o
som do tambor a Lua pensou que o Macaquinho houvesse chegado à Terra e cortou a
corda. O Macaquinho caiu e, antes de morrer, ainda pode dizer a uma moça que o
encontrou, que aquilo que ele tinha era um tamborinho, que deveria ser entregue
aos homens do seu país. A moça foi logo contar a todos sobre o ocorrido.
Vieram pessoas de todo o país e,
naquela terra africana, ouviam-se os primeiros sons de tambor.
Lince
O MACACO E O HIPOPÓTAMO
Em uma época muito antiga, quando as bananeiras
produziam poucas bananas, existiam numerosos macacos.
Havia um deles chamado Travesso, que morava nas
margens do rio.
O macaco Travesso possuía um grupo de bananeiras
que lhe proporcionavam frutos suficientes para a sua alimentação, o que lhe
trazia satisfação e orgulho porque os seus frutos eram os mais saborosos da
região.
No rio habitava o hipopótamo Ra-Ra, que era o rei
daquelas paragens.
A corpulência desse animal era notável e tão grande
a sua boca, que podia tragar seis macacos de uma só vez.
Além disso, gostava imensamente de bananas e,
especialmente as da propriedade de Travesso.
Ra-Ra resolveu roubar-lhe as bananas, apesar de não
ser um ato muito bonito para um rei.
Ordenou então a todos os papagaios que as
trouxessem para a sua residência.
Entretanto, o macaco não arredava pé do seu grupo
de bananeiras, a fim de impedir que desaparecessem, furtados, os seus preciosos
frutos.
Os papagaios logo encontraram este obstáculo sério
e recorreram à astúcia para cumprir as ordens do rei.
Após uma conferência de várias horas estudando
diversas soluções para resolver eficientemente o problema do roubo, concordaram
em
dizer ao macaco que seu irmão estava muito
doente e desejava vê-lo.
Quando Travesso recebeu a notícia, bom irmão que
era, foi depressa procurar seu irmão doente.
Verificou logo que aquilo não era verdade.
Seu irmão estava gozando de boa saúde e, suspeitando
imediatamente do que se tratava, voltou a toda pressa para perto de suas
bananeiras.
Uma surpresa dolorosa o aguardava. Não ficara nem
uma banana para semente. Enquanto lamentava sua perda aproximou–se um papagaio,
dizendo-lhe:
— Oh!, irmão Travesso! Sabes que Ra-Ra, o
hipopótamo, nos obrigou a roubar-te as bananas e depois não nos quis dar uma
só!
— Ah! E’ assim? Então espera… Irei à casa de Ra-Ra
e tirar-lhe-ei as minhas bananas! — exclamou o macaco.
A serpente» que é um animal invejoso, cheio de
defeitos, dos quais o pior é o espírito de intriga, passou por ali por acaso
quando o ma-
caco falava e, ato contínuo, foi contar tudo ao
hipopótamo.
— Está bem! — disse Ra-Ra. — Em tal caso ordeno ao
Travesso que compareça aqui quanto antes.
A Serpente voltou ao lugar em que vivia Travesso e
lhe deu a ordem de Ra-Ra, de modo que o macaco se pôs a tremer, pois, não era
tão valente como as suas palavras pareciam revelar.
Era preciso obedecer e quando se dispunha a fazer a
desagradável visita ao hipopótamo, ocorreu-lhe uma idéia.
Preparou com o maior cuidado uma boa quantidade de
visgo, a cola que usava para caçar passarinhos, e untou-se com êle muito bem.
Feito isto encaminhou-se para a casa de Ra-Ra, à
margem do rio.
— Disseram-me — disse-lhe o hipopótamo, ao vê-lo —
que ameaçaste de vir recobrar tuas bananas. É certo que o disseste?
— De modo algum, senhor — respondeu Travesso. —
Tanto minhas frutas como eu mesmo estamos à sua disposição.
O papagaio combinou com o macaco...
— Bem, fico muito satisfeito em ouvir estas
palavras. Sem dúvida, quiseram fazer intriga e contaram-me essa mentira.
Senta-te. Porém, procura fazê-lo de frente para mim e sem tocar em nenhuma das
bananas que estão atrás de ti.
Assim fêz Travesso, apoiando çom força as costas,
inteiramente untadas, contra as bananas.
— Disseram-me que sabes muitas histórias. Queres
contar-me uma?
O macaco dispôs-se a satisfazer o desejo de seu
soberano e lhe contou uma história muito interessante.
Enquanto isso não se esquecia de esfregar o corpo
contra as bananas afim de que aderisse às suas costas o maior nòmero delas.
Terminado o conto , Ra-Ra disse-lhe:
— Obrigado. Podes sair, mas toma cuidado para
saíres de frente para mim. Assim se deve fazer diante de um rei.
Nada podia favorecer melhor o macaco, que estava
com as costas cheias das bananas que a elas se haviam colado.
O macaco viu o hipopótamo
Quando se viu fora da casa do hipopótamo, pôs-se a
correr, ocultando-se.
Os papagaios não tardaram a descobrir a astúcia do
macaco e foram correndo contar a Ra-Ra.
O hipopótamo, ao tomar conhecimento da notícia,
teve tão grande ataque de raiva que virou de barriga para o ar, morrendo
instantaneamente.
Então, os animais reuniram-se e, diante da
inteligência do macaco, resolveram aclamá-lo soberano.
Ficou muito conhecido por sua esperteza e
deram-lhe, então, o nome de Sua Majestade Travesso I, o Esperto.
E o seu governo foi sábio e prudente, durante anos
e anos.
Grupo: Jongo
o leopardo
Um dia, o leopardo Nebr teve fome e
logo tratou de arranjar maneira de encontrar comida, da forma mais fácil.
Pediu ao seu filho Shabeel, que espalhasse pelas redondezas que, ele, a Sua Alteza, o Rei da Floresta, se encontrava muito doente. Assim foi feito! Um pouco por todo o lado se começou a ouvir o seguinte anúncio:
O leopardo Nebr, nosso chefe, está a morrer.
Todos os animais devem vir visitá-lo.
Pouco a pouco, alguns animais começaram a chegar a casa de Nebr, que ao pressenti-los, deitou-se, fechou os olhos e fingiu-se de morto. Não demorou muito, para que novos cânticos começassem a circular:
O nosso Rei morreu, morreu.
Que tristeza a nossa!
Depois de Shabeel ter trancado as portas, Nebr levantou-se de repente e matou todos quantos se encontravam na sua casa; comendo uns e guardando outros, para mais tarde se refastelar.
Passado mais algum tempo, chegaram outros animais, para prestar as suas condolências. Entre eles, vinha a gazela, acompanhada do porco-espinho. Desconfiada, reuniu todos os presentes e contou-lhes das suspeitas que tinha sobre estarem a cair numa armadilha do leopardo. Como forma de precaução, decidiram procurar um lugar para se esconderem, caso fosse necessário. Todavia, só o porco-espinho é que não conseguiu encontrar um esconderijo.
É então, que a gazela, espreitando para dentro da casa de Nebr, teve a seguinte ideia:
-Porco-espinho, tu vais devagarinho esconder-te naquele buraco que está perto do leopardo. Depois, cravas-lhe no corpo um dos teus espinhos mais fortes e quando vires que as coisas estão mal paradas, escondes-te, que nós fazemos o mesmo.
Assim foi! O porco-espinho dirigiu-se para junto de Nebr, o qual continuava a fingir estar morto. Primeiro, espetou os espinhos devagarinho e nada aconteceu.
O leopardo estava mesmo morto!
Depois, decidiu cravar com mais força. Foi, então que , Nebr, não conseguindo aguentar as dores por mais tempo, se levantou e começou a correr atrás do seu agressor.
Todos se esconderam, enquanto o leopardo ficava cada vez mais furioso. Face a esta situação, a gazela cantarolou:
O leopardo é o Rei da Floresta pela sua força, mas não pela esperteza.
e os outros animais repetiram em coro:
Devemos a vida à pequena e esperta gazela.
A ela devemos a vida!
grupo:orix site:cia dos
jovens griot's
A lenda do tambor africano
Dizem na Guiné que a primeira viagem à Lua foi feita pelo Macaquinho de nariz branco. Segundo dizem, certo dia, os macaquinhos de nariz branco resolveram fazer uma viagem à Lua a fim de traze-la para a Terra. Após tanto tentar subir, sem nenhum sucesso, um deles, dizem que o menor, teve a idéia de subirem uns por cima dos outros, até que um deles conseguiu chegar à Lua.
Porém, a pilha de macacos desmoronou
e todos caíram, menos o menor, que ficou pendurado na Lua. Esta lhe deu a mão e
o ajudou a subir. A Lua gostou tanto dele que lhe ofereceu, como regalo, um
tamborinho. O macaquinho foi ficando por lá, até que começou a sentir saudades
de casa e resolveu pedir à Lua que o deixasse voltar.
A Lua o amarrou ao tamborinho para
descê-lo pela corda, pedindo a ele que não tocasse antes de chegar à Terra e,
assim que chegasse, tocasse bem forte para que ela cortasse o fio.
O Macaquinho foi descendo feliz da
vida, mas na metade do caminho, não resistiu e tocou o tamborinho. Ao ouvir o
som do tambor a Lua pensou que o Macaquinho houvesse chegado à Terra e cortou a
corda. O Macaquinho caiu e, antes de morrer, ainda pode dizer a uma moça que o
encontrou, que aquilo que ele tinha era um tamborinho, que deveria ser entregue
aos homens do seu país. A moça foi logo contar a todos sobre o ocorrido.
Vieram pessoas de todo o país e, naquela terra
africana, ouviam-se os primeiros sons de tambor
grupo:orix
Conto Africano - POR QUE A GIRAFA NÃO TEM VOZ
Houve uma época em que os animais da floresta falavam todos a mesma língua. A girafa gostava de se vangloriar dizendo que era a rainha dos bichos porque tinha o pescoço mais comprido. Como era mais alta que os outros, costumava ficar olhando para o céu e conversando sozinha consigo mesma.
Os outros bichos logo começaram a se irritar com essa mania da girafa, especialmente na hora em que tentavam tirar uma soneca depois do almoço.
Irritados, começaram a traçar um plano para silenciar a chata da girafa. O leopardo foi até a grandalhona e provocou:
___ Você fica aí contando vantagem o dia inteiro, mas tem coisas que não sabe fazer.
A girafa, que era muito atrevida, gritou:
___ O que por exemplo?
___ Correr mais rápido do que eu _ desafiou o veloz leopardo.
___ Aceito _ respondeu a girafa, sem pestanejar. ___ Me avise a hora e o lugar.
O dia da corrida foi logo marcado. O leopardo, certo que ia vencer, convocou todos os animais da floresta para vê-lo derrotar a grandona. Os bichos correram para se divertir e torcer pela derrota da girafa.
Assim que foi dada a largada, os dois saíram em disparada lado a lado, mas logo o leopardo tomou a dianteira. Corria tanto que acabou chocando-se contra uma árvore e teve de abandonar a competição.
A bicharada ficou muito decepcionada ao ver a girafa se tornar campeã. Depois da vitória, ela ficou mais faladora ainda.
Ninguém tinha mais paciência para aguentar aquele blá-blá-blá infindável. Até que o macaco, esperto como ele só, resolveu dar um jeito na questão.
Ele tirou um bocado de resina de uma árvore e misturou-a na ramaria que a girafa costumava mastigar. Depois, escondeu-se, esperando a falastrona chegar para comer.
As folhas prenderam-se no comprido pescoço da girafa e, por mais que ela tossisse e cuspisse, ficaram grudadas em sua garganta, calando-a para sempre. Daí em diante seus descendentes passaram a nascer sem voz.
grupo:khalil
o sahuli
Era uma vez um homem que se chamava Sahúli. Era cego e tinha dois filhos que se dedicavam à caça e andavam com uma espingarda.
Um dia, os filhos foram caçar para a região deserta
e levaram o pai, para que guardasse a carne. Quando chegaram, montaram o
acampamento e partiram para a caça.
O pai ficou sozinho e começou a ouvir atrás de si:
nji!nji! Eram passos de uma pessoa. E Sahúli disse:
- Sê benvindo, amigo!
O que tinha chegado, respondeu:
- Obrigado, amigo! E perguntou a Sahúli:
- Ó amigo! De que é que sofres? Estás cego dos
olhos ou do coração?
Sahúli respondeu: - Os olhos estão cegos! O
coração, cá dentro, está são!
O outro voltou-se: - Então diz: "Claridade"!
Quando Sahúli disse claridade, os seus olhos
abriram-se e viu o homem sentado à sua beira. Sahúli preparou um pouco de
tabaco, acendeu-o e deu-o ao amigo. Depois, os dois começaram a arrumar o
acampamento: foram à lenha, foram à água, varreram, fizeram comida. E tudo
ficou em ordem. Por fim, aquele que tinha vindo, disse: - Ó amigo! Estás cego
dos olhos ou do coração?
Sahúli respondeu: - Estou cego dos olhos. Então,
diz "Escuridão"! Disse o amigo. E Sahúli disse escuridão e deixou
logo de ver. Quando os filhos chegaram ao acampamento ficaram muito admirados e
perguntaram: - Quem arrumou tudo isto? Sahúli contou-lhe o que se tinha
passado, que tinha recuperado a vista por instantes. Os filhos disseram-lhe
então: - Se esse amigo voltar, quando ele te pedir para dizeres escuridão, tu
não dizes e em vez disso, vais dizer claridade. E vamos ver o que acontece!
Fez-se noite e eles deitaram-se. E de manhã lá foram para a floresta caçar. O
pai, mais uma vez, ficou no acampamento até que voltou a ouvir: nji!nji! Sahúli
disse-lhe: - Sê bem vindo, amigo. O outro responde-lhe: - Obrigado amigo! E
perguntou-lhe: - Ó amigo! De que sofres? Dos olhos ou do coração? Sahúli disse:
- Estou cego dos olhos! E o amigo pede-lhe para ele dizer "
Claridade".
Sahúli, mais uma vez, disse a palavra e os seus
olhos abriram-se. Sahúli preparou novamente um pouco de tabaco, acendeu-o e
ofereceu-lho. Depois de o terem fumado, começaram a fazer o trabalho deles.
Sahúli não se tinha esquecido do conselho dos
filhos. Tirou comida e ofereceu-a ao amigo. E tudo correu bem até ao fim. Até
que o outro se preparava para ir embora e perguntou a Sahúli:
- Ó Sahúli! Estás cego dos olhos ou do coração?!
Ele respondeu dizendo:
- Os olhos estão cegos! O coração está são! E o
outro:
- Ora diz "Escuridão"! Mas, Sahúli,
lembrando-se do que os seus filhos lhe tinham dito, respondeu:
- "Claridade". E eis que ele continuou a
ver! O amigo pegou numa mezinha que trazia consigo, aplicou-a nos olhos do
Sahúli e eles ficarão sãos.
Despediram-se, fizeram cargas de carne para o outro
e ele partiu. Quando os filhos voltaram, ficaram muito alegres por verem que o
pai tinha recuperado a vista. Deixaram o acampamento e foram para a aldeia,
onde os receberam com muitas palmas.
grupo: Antílope site:cia dos jovens griot's
Ananse
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Ananse, ou Anansi, é uma lenda
africana. Conta um caso interessante, no qual no mundo antigo não havia
histórias e por isso viver aqui era muito triste.
Houve um tempo em que na Terra não
havia histórias para se contar, pois todas pertenciam a Nyame, o Deus do Céu.
Kwaku Ananse, o Homem Aranha, queria comprar as histórias de Nyame, o Deus do
Céu, para contar ao povo de sua aldeia, então por isso um dia, ele teceu uma
imensa teia de prata que ia do céu até o chão e por ela subiu.
Quando Nyame ouviu Ananse dizer que
queria comprar as suas histórias, ele riu muito e falou: - O preço de minhas
histórias, Ananse, é que você me traga Osebo, o leopardo de dentes terríveis;
Mmboro os marimbondos que picam como fogo e Moatia a fada que nenhum homem viu.
Ele pensava que com isso, faria
Ananse desistir da idéia, mas ele apenas respondeu: - Pagarei seu preço com
prazer, ainda lhe trago Ianysiá, minha velha mãe, sexta filha de minha avó.
Novamente o Deus do Céu riu muito e
falou: - Ora Ananse, como pode um velho fraco como você, tão pequeno, tão
pequeno, pagar o meu preço?
Mas Ananse nada respondeu, apenas
desceu por sua teia de prata que ia do Céu até o chão para pegar as coisas que
Deus exigia. Ele correu por toda a selva até que encontrou Osebo, leopardo de
dentes terríveis. - Aha, Ananse! Você chegou na hora certa para ser o meu
almoço. - O que tiver de ser será - disse Ananse - Mas primeiro vamos brincar
do jogo de amarrar? O leopardo que adorava jogos, logo se interessou: - Como se
joga este jogo? - Com cipós, eu amarro você pelo pé com o cipó, depois
desamarro, aí, é a sua vez de me amarrar. Ganha quem amarrar e desamarrar mais
depressa. - disse Ananse. - Muito bem, rosnou o leopardo que planejava devorar
o Homem Aranha assim que o amarrasse.
Ananse, então, amarrou Osebo pelo pé,
pelo pé e pelo pé, e quando ele estava bem preso, pendurou-o amarrado a uma
árvore dizendo: - Agora Osebo, você está pronto para encontrar Nyame o Deus do
Céu.
Aí, Ananse cortou uma folha de
bananeira, encheu uma cabaça com água e atravessou o mato alto até a casa de
Mmboro. Lá chegando, colocou a folha de bananeira sobre sua cabeça, derramou um
pouco de água sobre si, e o resto sobre a casa de Mmboro dizendo: - Está
chovendo, chovendo, chovendo, vocês não gostariam de entrar na minha cabaça
para que a chuva não estrague suas asas? - Muito obrigado, Muito obrigado!,
zumbiram os marimbondos entrando para dentro da cabaça que Ananse tampou
rapidamente.
O Homem Aranha, então, pendurou a
cabaça na árvore junto a Osebo dizendo: - Agora Mmboro, você está pronto para
encontrar Nyame, o Deus do Céu.
Depois, ele esculpiu uma boneca de
madeira, cobriu-a de cola da cabeça aos pés, e colocou-a aos pés de um
flamboyant onde as fadas costumam dançar. À sua frente, colocou uma tigela de
inhame assado, amarrou a ponta de um cipó em sua cabeça, e foi se esconder
atrás de um arbusto próximo, segurando a outra ponta do cipó e esperou. Minutos
depois chegou Moatia, a fada que nenhum homem viu. Ela veio dançando, dançando,
dançando, como só as fadas africanas sabem dançar, até aos pés do flamboyant.
Lá, ela avistou a boneca e a tigela de inhame. - Bebê de borracha. Estou com
tanta fome, poderia dar-me um pouco de seu inhame?
Ananse puxou a sua ponta do cipó para
que parecesse que a boneca dizia sim com a cabeça, a fada, então, comeu tudo,
depois agradeceu: - Muito obrigada bebê de borracha.
Mas a boneca nada respondeu, a fada,
então, ameaçou: - Bebê de borracha, se você não me responde, eu vou te bater.
E como a boneca continuasse parada,
deu-lhe um tapa ficando com sua mão presa na sua bochecha cheia de cola. Mais
irritada ainda, a fada ameaçou de novo: - Bebê de borracha, se você não me
responde, eu vou lhe dar outro tapa."
E como a boneca continuasse parada,
deu-lhe um tapa ficando agora, com as duas mãos presas. Mais irritada ainda, a
fada tentou livrar-se com os pés, mas eles também ficaram presos. Ananse então,
saiu de trás do arbusto, carregou a fada até a árvore onde estavam Osebo e
Mmboro dizendo: - Agora Mmoatia, você está pronta para encontrar Nyame o Deus
do Céu.
Aí, ele foi a casa de Ianysiá sua velha
mãe, sexta filha de sua avó e disse: - Ianysiá venha comigo vou dá-la a Nyame
em troca de suas histórias.
Depois, ele teceu uma imensa teia de
prata em volta do leopardo, dos marimbondos e da fada, e uma outra que ia do
chão até o Céu e por ela subiu carregando seus tesouros até os pés do trono de
Nyame. - Ave Nyame! - disse ele -Aqui está o preço que você pede por suas
histórias: Osebo, o leopardo de dentes terríveis, Mmboro, os marimbondos que
picam como fogo e Moatia a fada que nenhum homem viu. Ainda lhe trouxe Ianysiá
minha velha mãe, sexta filha de minha avó.
Nyame ficou maravilhado, e chamou
todos de sua corte dizendo: - O pequeno Ananse, trouxe o preço que peço por
minhas histórias, de hoje em diante, e para sempre, elas pertencem a Ananse e
serão chamadas de histórias do Homem Aranha! Cantem em seu louvor!
Ananse, maravilhado, desceu por sua
teia de prata levando consigo o baú das histórias até o povo de sua aldeia, e
quando ele abriu o baú, as histórias se espalharam pelos quatro cantos do mundo
vindo chegar até aqui.
GRUPO:ADAEZAS
Os Griots
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Depois de um bom jantar, com a lua
brilhando, as pessoas de uma aldeia na África antiga podem ouvir o som de um
tambor, chocalho, e uma voz que gritava: "Vamos ouvir, vamos ouvir!"
Esses foram os sons do griot, o contador de histórias.
Quando eles ouviram o chamado, as crianças sabiam que estavam indo para ouvir uma história maravilhosa, com música e dança e música! Talvez hoje a história seria sobre Anansi, a aranha. Todo mundo adorava Anansi. Anansi podia tecer as teias mais bonitas. Ele foi quem ensinou o povo de Gana como tecer o pano de lama bonito. Anansi teve uma boa esposa, filhos fortes, e muitos amigos. Ele entrou em muita confusão, e usou sua inteligência e poder do humor de escapar.
Houve outras histórias que o povo gostava de ouvir mais e mais. Algumas histórias eram sobre a história da tribo. Alguns eram grandes guerras e batalhas. Algumas eram sobre a vida cotidiana. Não havia linguagem escrita na África antiga. Os narradores acompanhavam a história do povo.
Havia geralmente apenas um contador de histórias por aldeia. Se uma vila tentava roubar um contador de histórias de outra aldeia, era motivo de guerra! Os contadores de histórias foram importantes. Os griots não eram as únicas pessoas que podiam contar uma história. Qualquer um poderia gritar: "Vamos ouvir, vamos ouvir!" Mas os griots eram os "oficiais" contadores de histórias. O griot aldeia não tem que trabalhar nos campos. Sua tarefa era contar histórias.
Mil anos mais tarde, novas histórias sobre novos triunfos e novas aventuras ainda estão sendo informados pela aldeia pelos Griots.
http://africa.mrdonn.org/fables.html
GRUPO: Adaezas
A CIDADE À NOITE
A festa dos reclamos luminosos
é minha.
Não gosto de coisas reais.
Todas as ilusões
me pertencem.
Sou milionário universal
da fantasia.
Gosto de passar pelas montras
e sonhar...
Sonhar sonhando,
sem cobiça,
sem pólvora, sem sangue,
sem ódio,
sem ferir o mundo.
Jorge Macedo/Angola
http://humanasblog.wordpress.com/2009/06/23/poesia-africana/
grupo:khalil
Amei o conto "Ananse" ajudou mt o glossário pois nao sabia algumas palavras !!! meus PARABENSS
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